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7 dicas de Steven Pinker para escrever melhor

Por Bruno Vaiano para Revista Galileu

escritas-pinkerPinker é um cara tão legal, diga-se de passagem, que quando o mundo parou para decidir de qual cor era o agora célebre vestido azul e preto – ou será branco e dourado? –, ele se prontificou e deu a explicação. Mas isso é assunto para outro post.

O fato é que ele é um cara muito bom em uma coisa que interessa a muita gente: colocar informação no papel. E em 2014 decidiu compartilhar sua cartola de truques com o livro Sense of Style – que agora chega ao Brasil como Guia de Escrita (Editora Contexto, R$ 49,90). A GALILEU separou algumas dicas valiosas – e o livro está cheio de muitas outras.

1. Esqueça essa história de que antigamente as pessoas escreviam melhor.

Se uma pessoa está na face da Terra há muito tempo, é natural que se incomode com mudanças culturais. Mas você não pode deixar suas tradições e opiniões transformarem seu texto em um autêntico José de Alencar. A verdade é que a língua muda rápido, e desde que o mundo é mundo professores e acadêmicos estão reclamando da decadência moral e linguística. Pinker faz até uma coletânea de exemplos de várias épocas. Em 1478 o tipógrafo William Caxton afirmou que “nossa língua tal como é usada hoje difere de longe daquela que era usada e falada quando eu nasci”. Já um anônimo de 1917 foi categórico: “Nossos calouros não sabem soletrar, não sabem pontuar. Todos os colégios estão desesperados, porque os alunos desconhecem os rudimentos básicos”.

2. Fuja do jargão de sua área do conhecimento. Rápido. 

Já tentou ler um texto jurídico? Ou o manual de instruções para a instação de um roteador em casa?  Ou mesmo um dos artigos científicos que a GALILEU lê todos os dias para te atualizar? Pois é, a redação é indecifrável em grande parte dos casos. Pinker afirma que é difícil para uma pessoa saber como é para outra pessoa não saber o que ela sabe. Em outras palavras, quando você entende tudo de um assunto, tem a impressão de que todo entende pelo menos um pouquinho. A consequência é o que ele denomina “maldição de conhecimento“. Em resumo: evita abstrações demais, e use palavras que todo mundo conhece. Não vai doer nada, e vai te ajudar a enviar sua mensagem ao maior número possível de pessoas.

3. Evite transformar verbos em substantivos.

O fechamento brusco da peça pode ocasionar a quebra de suas dobradiças. Não é difícil topar com um aviso como esse na caixa de um produto qualquer. Soa péssimo, e o pecado está em não assumir as ações. Por que usar “ocasionar a quebra” se “quebrar” é tão mais simples? Pinker chama esse tipo de substantivo de “zumbi“, e dá uma boa sugestão: trazer todos de volta à vida verbal: Fechar a peça bruscamente pode quebrar suas dobradiças.

4. Diminua a distância entre palavras relacionadas entre si.

Ouviram do Ipiranga as margens plácidas… De um povo heróico o brado retumbante.

Que tal colocar na ordem? As margens plácidas do Ipiranga ouviram o brado retumbante de um povo heróico. Ufa! Vamos do hino nacional a Os Lusíadas, de Camões.

As armas e os barões assinalados,
Que da ocidental praia Lusitana,
Por mares nunca de antes navegados,
Passaram ainda além da Taprobana,
Em perigos e guerras esforçados,
Mais do que prometia a força humana,
E entre gente remota edificaram
Novo Reino, que tanto sublimaram;

O sujeito são “as armas e os barões assinalados”. O verbo, “cantando”.

Você não viu o verbo na estrofe acima? Pois é. A não ser que você seja Camões, separar os dois dessa maneira não é uma boa maneira de escrever um e-mail para seu chefe. À proposito, ele está destacado na estrofe abaixo, 14 versos depois.

E também as memórias gloriosas
Daqueles Reis, que foram dilatando
A Fé, o Império, e as terras viciosas
De África e de Ásia andaram devastando;
E aqueles, que por obras valerosas
Se vão da lei da morte libertando;
Cantando espalharei por toda parte,
Se a tanto me ajudar o engenho e arte.

5. Use as vozes passiva e ativa para dirigir o olhar do leitor para o que interessa.

A voz passiva é considerada por alguns gramáticos e revisores uma grande inimiga de uma boa redação. Não seja tão radical. Como você pode perceber pela frase anterior — que está em voz passiva — começar uma frase por seu objeto é um ótimo jeito de chamar a atenção do leitor para o que realmente interessa. O contrário pode até dar certo: Alguns gramáticos e revisores consideram a voz passiva uma grande … Mas tiraria o foco do assunto da frase.

Pinker também lembra que ela pode tirar do caminho sujeitos que não interessam para quem lerá a frase. Em helicópteros foram levados ao local do incêndio, o ouvinte não precisa saber quem são os pilotos. Políticos e jornalistas sabem muito bem disso, e podem usar a passiva para omitir o sujeito quando, na verdade, ele é de interesse público, como em R$ 25 milhões foram desviados de uma empresa estatal em vez de João da Silva desviou R$ 25 milhões de empresa estatal.

6.  Use sinônimos para não repetir palavras, mas não exagere na dose.

Não é uma boa ideia repetir uma palavra vezes demais. João é legal. João foi à escola. Lá, João falou com seus amigos. É por isso que no gênero jornalístico uma instrução comum é não repetir palavras essenciais para a matéria na mesma página. Buscar sinônimos, porém, pode te levar a construções desconfortáveis.

Isso acontece, em primeiro lugar, porque não há tantos sinônimos assim: gato pode ser trocado por bichano ou felino, mas seu nome científico, Felis catus, já seria um exagero fora de um texto especializado. Outro é que é preciso tomar cuidado para usar palavras na sua ordem de abragência. Dá para dizer O ônibus acelerou. As pessoas caíram dentro do veículo. Já O veículo acelerou. As pessoas caíram dentro do ônibus não deixa claro que o veículo em questão é um ônibus. A categoria “veículo” engloba muitas coisas, entre elas, ônibus.

7. Tome cuidado com ambiguidades sintáticas.

A polícia cercou o ladrão do banco na rua Santos. Afinal, o ladrão do banco da rua Santos foi cercado em um lugar qualquer ou o ladrão de um banco qualquer foi cercado na rua Santos? Quando conhecemos uma história, o significado de uma frase parece óbvio. Tão óbvio que não temos o costume de revisar para ver se alguém poderia entender algo completamente diferente.