É estranho como alguns estereótipos se fixam na cabeça das pessoas. Se, para muitos, o Vietnã ainda é sinônimo de uma guerra que já terminou há mais de quarenta anos, a Colômbia, na cabeça de muita gente, remete apenas ao bandido Pablo Escobar, morto há mais de vinte, ao narcotráfico e à violência. Sim, o narcotráfico é importante para se compreender os colombianos, mas de forma alguma o país e sua população se reduzem a isso. É o que veremos ao longo deste livro.
Etnicamente, os colombianos lembram os brasileiros, com sua forte miscigenação entre brancos, negros e indígenas. Na Colômbia, todos os climas se fazem presentes: tropical em San Andrés, equatorial na região amazônica, mediterrâneo em Boyacá, oceânico no lago de Tota, desértico frio na Villa de Leyva e polar em Nevado Del Ruiz. Suas praias são belíssimas, levando milhares de brasileiros a conhecer o Caribe sem precisar se deslocar até a República Dominicana.
Politicamente, ao contrário de seus vizinhos, os colombianos praticamente desconhecem golpes militares; na Colômbia, a esquerda é tremendamente frágil e o país não teve governos populistas. Ou seja, nesses aspectos, a trajetória dos colombianos é única. Isso não significa que a Colômbia tenha uma história tranquila, pelo contrário. Por fatores que o leitor conhecerá no decorrer do livro, a violência se tornou um triste padrão de resolução de questões políticas no país. Mas, em várias situações, os colombianos têm demonstrado capacidade de superar problemas terríveis e seguir com suas atividades cotidianas em circunstâncias que, para o observador estrangeiro, pareceriam desesperadoras.
A economia da Colômbia também vai muito além das drogas; o país é um grande produtor de petróleo e esmeraldas, e seu café de qualidade é apreciado em várias partes do mundo. A estabilidade econômica local, em muitos momentos, pode fazer inveja a outros países da América do Sul.
De fato, a Colômbia é muito mais do que vidas desperdiçadas e oportunidades não aproveitadas. Os colombianos podem se orgulhar de ter como conterrâneos um dos maiores escritores latino-americanos de todos os tempos, Gabriel García Márquez, um grande pintor e escultor reconhecido mundialmente, Fernando Botero, e uma estrela pop de primeira grandeza, Shakira. Além disso, posso afirmar sem medo de errar que o melhor da Colômbia é o colombiano. Creio que o Brasil teve uma pequena demonstração disso na solidariedade espontânea e desinteressada dos habitantes de Medellín que lotaram um estádio de futebol para homenagear uma equipe brasileira em ascensão e que vivera uma tragédia em 2016. E o que dizer da diretoria do Atlético Nacional, que abriu mão de um título e da polpuda premiação para gentilmente cedê-la à Chapecoense?
Os colombianos são um caso de amor para mim. Uma viagem fortuita (que poderia ter sido para os vizinhos Chile ou Peru) acabou me levando à Colômbia, e de lá na verdade nunca mais saí. Essa viagem levou a outras, favorecendo a construção de amizades e relações profissionais. Passei a acompanhar o noticiário do país como se lá estivesse. Comecei a estudar a fundo a história dos colombianos e a me interessar pelas várias dimensões de sua cultura. Além de entender as questões políticas, me apaixonei pela teledramaturgia (e tive que encarar vários olhares incrédulos até dos próprios colombianos quando dizia que acompanhava suas novelas), pelo cinema e pela música. Os vários estilos musicais colombianos se tornaram companheiros permanentes nos meus fones de ouvido e remetem constantemente àquele país, com suas cores, vozes e cheiros marcantes.
No entanto, o meu olhar é o de um brasileiro, de alguém que vê de fora o que muitas vezes os próprios colombianos não percebem. (A condição de estrangeiro faz com que muitas vezes tenhamos uma visão mais clara de certos aspectos do cotidiano que já foram naturalizados pelos locais.) Em momento algum me privo de mostrar também aspectos não tão edificantes de sua sociedade.
Acredito que conhecer a cultura, a história e o cotidiano de um povo tão variado e complexo, tão diferente, mas ao mesmo tempo com tantas semelhanças com o nosso, como os colombianos, é uma experiência enriquecedora. Espero que este livro leve o leitor a reavaliar entendimentos anteriores, aprender mais sobre esses nossos irmãos latino-americanos e até, quem sabe, descobrir que os colombianos, com suas singularidades evidentes, estão muito mais perto de nós do que se imagina.
Andrew Traumann é historiador graduado pela Universidade Estadual de Londrina, mestre em História e Política pela Universidade Estadual Paulista (campus Assis) e doutor em História, Cultura e Poder pela Universidade Federal do Paraná. É professor de História das Relações Internacionais e de História da Política Externa do Brasil no curso de Relações Internacionais do Centro Universitário Curitiba. Costuma viajar com frequência para a Colômbia, país onde fez muitos amigos e que considera sua segunda pátria.