Viver em casa ou procurar uma comunidade voltada para o público sênior são opções bem distintas, ambas com defensores.
Conforme envelhecemos, muda o conceito do que é o lar, doce lar? Podemos pensar do ponto de vista do imóvel: para quem teve filhos, a casa vazia parece grande demais, enquanto quem sempre viveu só talvez continue se sentindo confortável no espaço que ocupa. No entanto, se ajustarmos o foco para conexões sociais, será que aquele ainda é um lugar que estimula a socialização, no qual a pessoa se sente parte de uma comunidade, ou não há mais laços, apenas um isolamento progressivo? A longevidade produz diferentes grupos de velhos e cada um tem necessidades específicas, por isso devemos fugir de generalizações.
A maioria prefere a ideia de envelhecer em casa, até um eventual limite imposto por sua capacidade física e intelectual. Mas há também os defensores de comunidades desenhadas para o público sênior, que advogam que essa convivência vai alimentar espírito e intelecto. Quem tem razão? Não acredito que exista uma única resposta para a questão, mas ponho em discussão alguns pontos levantados num debate realizado no dia 30 de setembro pelo laboratório de inovação da AARP, a associação dos aposentados norte-americanos, que reúne quase 40 milhões de afiliados.
De um lado estava Tach Branch-Dogans, fundadora e CEO da The Network for Later-Life Transitions, empresa especializada em criar um ambiente favorável para o chamado “aging in place”, isto é, envelhecer em casa. “Lar é algo que associamos a alegria, bem-estar. É onde estão nossos objetos e referências, e ninguém quer se separar do seu passado. Hoje em dia, a tecnologia é uma poderosa aliada, através de sensores e aplicativos, para garantir a independência dos idosos e dar segurança a seus filhos, amigos e familiares, que podem checar se está tudo bem”, afirmou. Seu trabalho inclui fazer um levantamento da rotina da pessoa e propor adaptações: “muitas vezes, o idoso diminui sua circulação pelo imóvel e podemos convencê-lo a reutilizar o espaço ocioso de outra forma, até chamando alguém para morar com ele, ou a se mudar para um lugar menor, mas que mantenha os laços que mais preza”.
Os números são expressivos: em 2030, 20% dos norte-americanos terão mais de 65 anos e, desse contingente, 22% – o equivalente a 15 milhões – não terão cônjuge, filhos ou familiares. Quem sugere uma solução completamente diversa é Nick Smoot, fundador e CEO do Innovation Collective: “lar é o lugar das rotinas que desenhamos ao longo da nossa história, do pertencimento, da segurança. Essa é uma relação que construímos com pessoas, e não com objetos. A dispersão das famílias só tem agravado o problema do isolamento. Quando tentam me convencer de que o idoso pode participar e contribuir com sua comunidade, eu pergunto como isso é possível, se as vizinhanças também se isolaram e está cada um no seu casulo?”.
O modelo de cohousing surgiu na Dinamarca na década de 1960: um condomínio cuja disposição das moradias é feita para facilitar a proximidade de seus ocupantes, com áreas de lazer compartilhadas, mas garantia de privacidade. Você só socializa quando quiser, mas é o tipo de alternativa para quem tem dinheiro no bolso. Por aqui, há um longo caminho pela frente quando se trata de residências para idosos. São poucas e caras as opções de boas instituições de longa permanência (ILPI), o nome palatável para espantar o preconceito que cerca casas de repouso ou asilos. Entretanto, questões como o respeito ao exercício da sexualidade e à orientação sexual têm se mostrado um enorme desafio que o setor não aborda.
No dia 1º de outubro, foi lançado um novo site da Frente Nacional de Fortalecimento das ILPIs, cuja proposta é oferecer orientação para melhorar o atendimento desses estabelecimentos. É possível consultar a lista de instituições disponíveis em cada município e haverá cursos de capacitação. Foram elaboradas diversas cartilhas: guia de manejo da Covid-19, cuidados fisioterapêuticos e orientações para os profissionais, entre outras. A Frente foi criada em abril de 2020, fruto de um movimento de mais de 1.500 voluntários de formação profissional variada: de cuidadores a médicos; de gestores a professores universitários.
Fonte: Blog Longevidade modo de usar – G1
Mariza Tavares é jornalista formada pela Universidade Federal Fluminense. Fez mestrado em comunicação na UFRJ e MBA em gestão de negócios no Ibmec. Desde 2016, mantém o blog “Longevidade: modo de usar”, no portal G1. Também dá aulas na PUC-Rio e participa do conselho editorial da Agência Lupa, especializada em fact-checking. Foi diretora-executiva da Rádio CBN entre 2002 e 2016, onde criou o programa “50 Mais CBN”, do qual participava com o médico Alexandre Kalache e a jornalista Mara Luquet, e, antes disso, editora-executiva do jornal O Globo e repórter da revista Veja.