Exceto para os seguidores da seita criada por Bolsonaro, que se recusam a enxergar o quadro, a desobediência ao distanciamento social cria problemas que ferem mortalmente a saúde da população nesses tempos de Covid-19.
Comunica uma ideia de confusão permitida, relativizando as recomendações divulgadas pela ciência e pela OMS. Revela o quanto o presidente da república é tosco e lida mal com conhecimentos construídos com um mínimo de embasamento, motivo porque prefere banalizá-los, devido ao incômodo causado pela revelação da própria ignorância. A falta de uma atitude mais refinada, naturalmente, compromete a qualidade da prática das pessoas em relação à pandemia, e coloca em risco uma nação inteira.
A maneira de pensar e agir em relação a essa crise sem precedentes precisa ser revista com urgência. Ela deve levar a cada conhecido, cada vizinho, colega de trabalho, de escola ou de igreja uma mensagem clara de que o distanciamento social é algo sério. É pra valer. É muito mais do que uma simples opção, dessas que a gente faz em relação à compra de uma roupa ou do sabor de um sorvete. Talvez esse comportamento não interesse a uma parte do poder, na forma como hoje ele é personificado. Mas Brasília não é senhora das nossas vidas.
Tudo bem, as pessoas precisam garantir recursos financeiros mínimos para o sustento pessoal e da família. E entende-se que é justificável o desejo de atender essa demanda inegável por meio do trabalho. Gente honesta deseja trabalhar. Quem valoriza a possibilidade de oferecer sua contribuição para a sociedade deseja trabalhar. Quem se importa com a realização pessoal, obtida na execução de um projeto profissional, igualmente não sonha em permanecer eternamente em casa. Apenas se relaciona bem com um final de semana prolongado. Ou com um tempo de férias, vivido uma vez por ano, como é de praxe. A questão toda é: relaxar e ir ao trabalho, às compras ou lazer? Agir sem critérios, neste cenário em que, já sabemos, isso só vai agravar o quadro de saúde em todo o país, levando muita gente para os hospitais e, depois, para os cemitérios? Faz sentido?
Boa parte das empresas aceitou e se adequou a essa nova realidade. Até a Igreja, lenta na tomada de decisões e sensibilizada pela tragédia italiana, entendeu que suas portas devem permanecer fechadas, sem com isso insinuar que os laços entre os fiéis e Deus devem ser rompidos. A propósito, não vejo uma alternativa viável de se reencontrar o caminho e a ordem, se o Criador não estiver no comando de todo esse projeto. Primeiro, impedindo que o barco afunde definitivamente. Depois, ajudando-nos a reconstruir a vida, certamente dentro de parâmetros mais sensatos para evitarmos uma espécie de “Vale a pena ver de novo” possível. A não ser que se torne inevitável vivenciarmos a anedota que ouvi de um amigo, segundo a qual um dia Deus disse “Noé, faz backup, porque eu vou deletar.” Isso seria, no mínimo, lamentável. Ou não. Porque não sobraria um sequer para lamentar o fim da história humana sobre a terra.
Pergunto: por que, levados pela irresponsabilidade de políticos sem escrúpulos, numa campanha eleitoral absurda e fora de hora, e dispostos a pagar para ver, a gente aceitaria se lançar nessa jornada suicida? Isso seria diabólico. Geralmente, velórios têm força suficiente para convencer as pessoas a se manterem em casa, dentre outras coisas. Em silêncio, eles gritam. Um em cada família resolveria? Será esse o preço do nosso crescimento pessoal?
RUBENS MARCHIONI é palestrante, produtor de conteúdo, blogueiro e escritor. Eleito Professor do Ano no curso de pós-graduação em Propaganda da Faap. Pela Contexto é autor de Escrita criativa. Da ideia ao texto. https://rumarchioni.wixsite.com/segundaopcao / e-mail: [email protected]