Paulo Saldiva comenta relatório do Inpe, segundo o qual as queimadas no Brasil só têm aumentado, apesar de o País possuir os mecanismos necessários para detectá-las e reprimi-las, preferindo, em vez disso, agir como o conhecido personagem folclórico, que olha para a frente, mas tem os pés voltados para trás
Relatório do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais), emitido em outubro passado, revela que as queimadas no Brasil, em vez de diminuírem, aumentaram em cerca de 20% em comparação aos dados obtidos há um ano. Diz o colunista: “De um lado, existe um comprometimento das autoridades, no sentido de preservação da mata, e o resultado é um aumento das queimadas. Mais intrigante ainda é o fato de que o Brasil dispõe de um sistema sofisticado de satélites para detectar queimadas em tempo real”. Ele prossegue: “Mais intrigante ainda se torna essa situação quando sabemos que temos uma legislação e um código florestal bastante avançado. Por que, se nós temos um compromisso internacional de reduzir o desmatamento, se nós temos instrumentos para quantificar e saber onde está ocorrendo o desmatamento, e também temos uma base de leis que permite a adoção das medidas previstas pela legislação?
Para Saldiva, é verdade que o País possui uma política ambiental avançada, no entanto, “a execução dessa política é que é bastante deficiente”. Atividades ilegais e o comércio de madeira e o agronegócio são em grande parte responsáveis por essa situação, “e ao mesmo tempo você não tem medida nenhuma. Se isso não for objeto de uma investigação séria, com determinação e apuração dos culpados, eu não sei mais o que poderia ser”, desabafa o colunista. Nesse aspecto, complementa, o Brasil mais parece, na área ambiental, o curupira, que olha para a frente, embora os pés estejam voltados para trás.
Fonte: Jornal da USP por Paulo Saldiva
O professor Paulo Saldiva é autor do livro Vida urbana e saúde
Somos um país urbano: 84% da população brasileira concentra-se em cidades e ao menos metade vive em municípios com mais de 100 mil habitantes. Mas a vida urbana não traz apenas novas oportunidades. Ela propicia doenças provocadas por falta de saneamento, picadas de mosquitos, poluição, violência, ritmo frenético… E tudo isso não ocorre mais apenas nas grandes cidades, mas também nas médias e mesmo pequenas, quase sempre negligenciadas pelo poder público e pelos próprios cidadãos. Mas, afinal, o que fazer para ter boa qualidade de vida nas cidades? Assim como o médico deve pensar na saúde dos seus pacientes – e não apenas em tratar determinada doença –, uma cidade saudável é aquela em que seus cidadãos têm boa qualidade de vida. E o médico Paulo Saldiva, pesquisador apaixonado pelo tema, mostra que é possível, sim, melhorar e muito o nosso dia a dia.