O título e o conteúdo desta obra requerem explicações. Considerei, de início, três possíveis abordagens para seu desenvolvimento: 1) as relações internacionais como direito; 2) o direito nas relações internacionais; e 3) o direito das relações internacionais.
A primeira hipótese foi, de pronto, descartada. Ele pressupõe que as relações no plano externo só podem ser consideradas pelas lentes da ciência jurídica. Tendo em vista o referido na introdução, essa perspectiva é descabida. Contudo, considerando que os primeiros estudiosos da cena internacional a partir do advento do moderno sistema de Estados nacionais foram juristas, é perceptível sua influência no entendimento dos fatos internacionais.
Lembro, para exemplificar, o nome de alguns precursores: Francisco de Vitória, Francisco Suárez, Alberico Gentili, Hugo Grócio, Richard Zouch, Samuel von Pufendorf, Cornelius van Bynkershoek, Emer de Vattel, Christian Wolff. Todos deram importante contribuição, que ainda hoje é considerada. Porém, essa perspectiva não me parece mais compatível com a complexidade e a diversidade das relações internacionais
do momento presente.
Na sequência, considerei explorar o direito nas relações internacionais. De outra maneira, discorrer sobre as áreas da ciência jurídica que contribuem, de algum modo, com a análise dos fenômenos internacionais. Como se pode intuir, esse caminho enseja imenso desafio tendo em vista a crescente especialidade tanto do direito internacional quanto do doméstico. Para além do direito internacional público e seus inúmeros desdobramentos, teríamos de investigar o chamado direito internacional privado e levar em conta, ainda, o denominado direito comparado.
Seria preciso avaliar, também, nos ordenamentos jurídicos estatais individualmente considerados seu Direito das Relações Exteriores, conforme adiante descrito. E, mais, examinar o surgimento de novos campos temáticos fora do domínio estatal (p. ex., lex mercatoria, lex sportiva,lex digitalis) e, até mesmo, acima dele (p. ex., Direito da Integração). Desconheço autor que tenha lançado mão dessa abordagem. Ela ultrapassa o razoável e vai além dos propósitos desta obra.
Fiquei, desse jeito, com a derradeira solução, o direito das relações internacionais. Estimo que essa perspectiva passa por um direito internacional público ampliado no tocante às suas formas de manifestação (fontes) e à sua subjetividade (sujeitos). Some-se a isso leitura menos dogmática do seu caráter jurídico e destaque aumentado para determinados aspectos do direito local. Começo por decompor parte da nomenclatura mencionada, com acréscimo de outras possibilidades. Esse exercício é indispensável para que o aluno evite confusões comuns até entre os mais habilitados. Ao final, ofereço tentativa de definição.
Reconheço que essa concepção é passível de reparos. Pareceu-me, todavia, mais adequado apresentar o que chamo de direito das relações internacionais do que fazer, como parte da doutrina, exposição sob o título: direito internacional e relações internacionais. Essa perspectiva implica significativos desafios teóricos e metodológicos, o que em geral leva seus apoiadores a cuidar do assunto adotando o mesmo enquadramento do direito internacional público.
Dito isso, passo à análise das expressões citadas e previno que as descrições sugeridas delimitam como cada uma é usada neste texto e contexto.
Direito das Relações Internacionais é o 6º livro da coleção “Relações Internacionais” que reúne manuais introdutórios essenciais para as disciplinas obrigatórias dos cursos de graduação e é coordenada por Antônio Carlos Lessa, professor titular da Universidade de Brasília. Voltados especialmente para estudantes, os livros são escritos em linguagem direta e acessível por grandes especialistas em cada tema. Além do curso de Relações Internacionais, as obras também são indicadas para Ciência Política, Sociologia, Direito e Comércio Exterior.
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Márcio P. P. Garcia é doutor em Direito Internacional pela Universidade de São Paulo (USP) e mestre (LLM), na mesma área, pela Universidade de Cambridge. É consultor legislativo do Senado Federal na área de Direito Internacional.