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Crescimento de São Paulo, enfrentou resistência

Crescimento de São Paulo, no início do século 20, enfrentou resistência de moradores do centro. Os processos de modernização da cidade não conseguiram excluir do centro moradores e pessoas que lá conviviam.

No início do século 20, medidas que foram adotadas pelo poder público visando a embelezar a cidade de São Paulo foram efetivadas, mas não conseguiram retirar pessoas que conviviam e viviam no centro paulistano. “Os melhoramentos foram implementados no sentido de transformar o que era a ‘cidade do café’ numa metrópole urbanizada e saneada”, descreve ao Jornal da USP a historiadora Maíra Rosin.

Crescimento de São Paulo, enfrentou resistência

Ela é autora de um estudo de doutorado que analisou como foi que algumas pessoas resistiram a esse processo, permanecendo e seguindo com suas vivências à revelia das políticas públicas. A pesquisa, intitulada Dos bêbados, das putas e dos que morrem de amor: os marginais do embelezamento e dos melhoramentos urbanos (1905-1938), teve a orientação da professora Beatriz Piccolotto Siqueira Bueno e foi defendida neste ano de 2021 na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (FAU) da USP.

O ponto de partida dos estudos de Maíra foi a demolição, em 1905, da Igreja Nossa Senhora do Rosário dos Homens Pretos, então localizada na Praça Antônio Prado, local que hoje integra a área do centro financeiro da cidade. “A demolição da igreja fez parte das primeiras grandes reformas da cidade, que envolvia o alargamento de avenidas e construção de bulevares, entre outras ações da administração pública”, conta a pesquisadora.

A igreja foi construída entre os anos de 1721 e 1722 e era um espaço de reunião de negros e escravizados, que celebravam ritos católicos misturados com crenças de origem banto. Uma nova igreja já vinha sendo construída desde 1904 e foi consagrada em 1906, no Largo do Paissandu. O período final do estudo, 1938, se refere à data da publicação do Relatório sobre os Divertimentos Públicos, do Departamento de Cultura da Capital, elaborado pelo poeta Mário de Andrade, que era responsável pelo Departamento de Cultura da cidade.

“A ‘higienização’ e a ‘moralização’ da cidade velha, aumentando o aburguesamento e a entrada de capitais no centro, não conseguiram impedir as diversas resistências e manutenções, mesmo quando as tentativas de controle ultrapassaram a ordem dos planejadores do espaço urbano.”

Autos-crimes
Dentre as principais fontes utilizadas para produzir o estudo, Maíra recorreu ao acervo do Arquivo do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo analisando os autos-crimes relatados à época. “Podemos dizer que são registros da polícia semelhantes ao que conhecemos hoje por Boletins de Ocorrência”, explica a historiadora. Nos autos-crimes constavam informações como nome do envolvido, nacionalidade, endereço, ocupação, horário da ocorrência, vítimas, réus, etc.

Além desses registros, a pesquisadora também se utilizou de mapas que foram elaborados por Mário de Andrade. “Nesses mapas havia as localizações de cabarés, dancings e casa de tolerância, por exemplo”, cita Maíra. Na época, o Departamento de Cultura tinha controle desses locais que foram demolidos na região das ruas Aurora, Vitória e Timbiras. Assim, o ano de 1938 marca a publicação do relatório. “Foi naquele ano que o engenheiro Prestes Maia, que acabara de assumir a Prefeitura da cidade, exonerou Mário de Andrade da direção do Departamento de Cultura. O poeta continuou na administração pública, mas em outra função dentro do departamento”, destaca a pesquisadora.

Resistência
Em todo esse processo, o estudo de Maíra destaca a resistência de parte dos moradores e pessoas que conviviam nas áreas centrais da cidade. E para descrever como se deu essa resistência, o trabalho foi dividido em três capítulos: “Dos bêbados”, que trata da presença e frequência dos botequins, jogos e divertimentos públicos no centro; “Das putas”, meretrizes, “mariposas”, mulheres de vida alegre e cortesãs, entre outras; “Dos que morrem de amor”, em que constam cenas de sangue, ciúmes e outros crimes.

Segundo a historiadora, os processos de resistência daquelas pessoas podem ser considerados naturais. “Por mais que o embelezamento das áreas centrais tentasse, de alguma forma, invisibilizar aquelas pessoas, elas conseguiram sobreviver”, conta.

Como consta na conclusão do trabalho, “a ‘higienização’ e a ‘moralização’ da cidade velha, aumentando o aburguesamento e a entrada de capitais no centro, não conseguiram impedir as diversas resistências e manutenções, mesmo quando as tentativas de controle ultrapassaram a ordem dos planejadores do espaço urbano”.

Sobre a migração da prostituição para o Bom Retiro, em 1940, foi delimitado um espaço depois da linha do trem, compreendido pelas ruas Itaboca (atual Cesare Lombroso) e Aimorés, que serviu como uma espécie de zona de confinamento da prostituição na cidade. Ali, as mulheres tinham controle policial, médico e moral, podendo se prostituir apenas dentro das casas. Em sua maioria, essas mulheres eram de origem judaica e ficaram conhecidas como “Polacas”.

O estudo também constata que bêbados, prostitutas e outras mulheres mantiveram circulação pelos espaços melhorados e embelezados pelo capital e pelo ideal de formação da “cidade moderna”, que passava também pelas relações de acesso à cultura e outros bens, apoiados pela polícia e por outras relações de controle que permeavam a cidade.

Fonte: Jornal da USP – Por Antônio Carlos Quinto

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