Engolidas pela água: as cidades inundadas por Stalin. Durante projetos de industrialização na Guerra Fria, vilas e aldeias ficaram em ruínas — desabrigando mais de 100 mil pessoas
O final da Segunda Guerra gerou, entre muitas coisas, a necessidade de crescimento nacional da União Soviética. A nação liderada pelo líder comunista Josef Stalin foi crucial para derrotar a Alemanha Nazista e os anseios de Adolf Hitler.
Pouco tempo depois do confronto armado que deixou milhões de mortos, a URSS se viu no centro de outra batalha: a Guerra Fria. Desta vez, o governante soviético competia com nações capitalistas, sobretudo os Estados Unidos, para avançar em setores como tecnologia, economia e geopolítica.
Assim, teve início a era de industrialização da União Soviética, pautada pela grandeza que o comunismo deveria representar, conforme ensinamentos do pensador Karl Marx. Entre os projetos gananciosos de Stalin, estava a construção de hidroelétricas, represas e canais.
No entanto, apesar de pensar no desenvolvimento nacional da URSS, alguns planos não saíram como o planejado, trazendo desgraça e morte para a população — especialmente da Ucrânia. As propostas visavam construir grandes empresas governamentais, mas para isso, as pessoas teriam que ajudar de uma forma controversa: deixando para trás suas casas.
Cidades inundadas
Antes mesmo de dar início às construções, autoridades soviéticas passavam por cidades e vilas dando ultimatos sobre quando as propriedades teriam que ser esvaziadas. Com tinta, eles escreviam na porta a data que a família era obrigada a se mudar.
“Não tinha alternativa, ninguém podia questionar nada. Era uma ordem e tinha que ser cumprida”, afirmou Svietlana Sliusarenkio em entrevista à BBC em 2021. A diretriz era que os moradores saíssem, deixando “apenas as paredes”.
Embora fosse apenas um garoto quando lhe tiraram a moradia na Ucrânia, Andriy Mastrienko relembra do momento em que deram a notícia desesperadora: “Eles disseram: ‘Vamos construir uma hidrelétrica e precisamos que você saia de casa porque essa área vai ficar alagada’”.
Quem decidisse resistir, morria afogado. Não havia questionamento, e mesmo que o governo oferecesse uma quantia em dinheiro, havia aqueles que preferiam morrer ao invés de deixar seu lar para ser engolido pela água.
Apenas para que o reservatório de Uglich começasse a existir, cerca de 130 mil pessoas ficaram desabrigadas. O episódio causou danos ao ecossistema da região e o deslocamento em massa de uma população que já não sabia para onde ir.
No total foram 5.000 km² inundados, incluindo igrejas, aldeias, cidades e até mesmo Mologa, uma vila medieval fundada em meados do século 12. As ruínas ficaram conhecidas como a ‘Atlântida Soviética’.
No começo da ‘desestalinização‘, encabeçada por Nikita Kruschev, documentos secretos afirmavam que os projetos eram construídos por presos em campos de trabalho, aonde eram mandados como uma sentença penal.
“Se eles não podiam ou não queriam desenterrar seus mortos, eles removiam as cruzes e passavam as escavadeiras para nivelar as abóbadas dos túmulos com o solo, para que os restos mortais não flutuassem quando as sepulturas estivessem debaixo d’água”, relatou também Sliusarenkio.
O caos estava instalado, a situação era bem diferente do planejado e, ainda hoje, historiadores encontram dificuldade em entender o período. A principal causa é a falta de registros, que nem mesmo a Rússia de Putin tentou reviver.
A ‘Atlântida Soviética’ permanece esquecida, com uma tentativa de lucro com pequenos empreendedores que oferecem passeios em meio ao passado obscuro, que entre tantos temores, ainda assombra os sobreviventes.
Fonte: Aventuras na História