O tempo dá coceira. Ninguém fica indiferente a ele. Tasso, lá por 1500, encontra-lhe uma aplicação: “Perdido está todo o tempo que em amor não se gasta”. “Tempo é dinheiro”, responde-lhe Teodore Wanke quatro séculos depois. “O que o tempo traz de experiência não vale o que leva de ilusões”, avalia Gabriel Pomeland. “És um senhor tão bonito quanto a cara do meu filho”, acha Caetano.
Machado de Assis não deixa por menos. “Matamos o tempo: o tempo nos enterra”, desabafa. Tinha acabado de ler o jornal. Estava à beira de um ataque epiléptico. O anúncio à sua frente dizia: “Nos domingos há missa na Igreja de São Francisco”.
A causa
Você sabe o porquê da indignação? O tempo. Ou melhor, a indicação do tempo. Nos domingos ou aos domingos? É um rolo. Hoje, então, está pior que nos tempos machadianos.
O tempo virou obsessão. A mãe, o pai, o chefe, o professor, o jornal, a TV, todos bombardeiam horários na nossa cabeça. Sem falar no amado, que marca jantar, cineminha, encontro.
O tiro pode sair pela culatra se a indicação dos ponteiros não estiver nos conformes. Foi o que ocorreu com Machado. Ele nunca mais foi à Igreja de São Francisco. “Quem não sabe a língua não pode traduzir a palavra de Deus”, pensou.
A diferença
Nos domingos ou aos domingos? Aos domingos significa todos os domingos: Vou à missa aos domingos. O comércio abre aos domingos. Você trabalha aos domingos?
Os outros dias da semana não fogem à regra. Pedem a preposição a quando indicam ação que se repete: Meu plantão é às quintas-feiras (todas as quintas). Os museus fecham às segundas-feiras (todas as segundas). Vejo meus filhos às quintas-feiras.
A preposição em (no sábado, na segunda) dá o seguinte recado: o fato ocorrerá uma só vez ou de vez em quando. Nada de repetições regulares: Paulo se casa no sábado. Vi Maria no domingo. O filho deles nasceu na quarta-feira.
A escolha
A língua é um sistema de possibilidades. Tem jeitos diferentes de dizer a mesma coisa. Você pode escolher: Vou à missa aos domingos. Vou à missa todos os domingos. Encontro Maria às segundas-feiras. Encontro Maria todas as segundas-feiras.
Não morra na praia. Para indicar ação que se repete regularmente, o pronome todo(toda) precisa estar no plural. E acompanhado do artigo os, as. “Janto fora todos os sábados” é a forma correta. Se você disser “Janto fora todo sábado”, sua mensagem será outra. Estará dizendo: “Janto fora qualquer sábado”. O recado vai pro beleléu.
Fonte: Blog da Dad
Dad Squarisi transita com desenvoltura pelo universo da língua. É editora de Opinião do Correio Braziliense, comentarista da TV Brasília, blogueira, articulista e escritora. Assina as colunas Dicas de Português e Diquinhas de Português, publicadas por jornais de norte a sul do país; Com Todas as Letras, na revista Agitação, e Língua Afiada, na Revista do Ministério Público de Pernambuco. Formada em Letras, com especialização em Linguística e mestrado em Teoria da Literatura, concentra o interesse, sobretudo, na redação profissional – o jeitinho de dizer de cada especialidade, cada grupo, cada mídia. Mas é tudo português. A experiência como professora do Instituto Rio Branco, consultora legislativa do Senado Federal e jornalista do Correio Braziliense iluminou o caminho dos livros Dicas da Dad – Português com humor, Mais dicas da Dad – Português com humor, A arte de escrever bem, Escrever melhor (com Arlete Salvador), Redação para concursos e vestibulares (com Célia Curto), Como escrever na internet, 1001 dicas de português – manual descomplicado, Sete pecados da língua, publicados pela Contexto, além de Superdicas de ortografia, Manual de redação e estilo para mídias convergentes, dos Diários Associados, e de livros infantis – de mitologia e fábulas.