Dizem que Hitler não mandou bombardear o bairro antigo de Paris por uma única razão — poupar Notre-Dame. Verdade ou mito, a história presta homenagem à obra. Majestosa, a catedral gótica, de 800 anos, recebe 13 milhões de turistas por ano, 30 mil por dia. Não por acaso é um dos cartões-postais da capital francesa. Não por acaso, também, inspirou poetas, escritores, pintores. Até Walt Disney.
A tragédia, claro, foi notícia em Europa, França e Bahia. Repórteres se desdobraram em busca de informações. Ao escrever os fatos apurados, pintaram dúvidas. Muitas dúvidas. Uma delas referia-se ao verbo destruir. A questão: destrói sempre se escreveu com acento. Mas a reforma ortográfica cassou o grampinho dos ditongos abertos ei e oi. E daí?
Meia verdade
Os jornalistas têm razão? Sim e não. Eles se esqueceram de pormenor pra lá de importante. A reforma só atingiu as palavras paroxítonas. Oxítonas, proparoxítonas e monossílabos tônicos permaneceram como dantes no quartel de Abrantes. Ora, constrói joga no time das oxítonas. A sílaba tônica é a última. Nota 10 para eu construo, ele constrói, nós construímos, eles constroem; eu destruo, ele destrói, nós destruímos, eles destroem.
Um lá, outro cá
Por só afetar as paroxítonas, palavras da mesma família mudaram de equipe. É o caso de herói e heroico. O dissílabo manteve o grampinho porque é oxítono. O trissílabo ficou com o ditongo livre e solto por ser paroxítono. Faz companhia a paranoico, estoico, joia, jiboia.
Eu sozinho
Monossílabos só têm uma sílaba. Por isso formam o time do eu sozinho. Apesar da pequenez, escaparam da facada da reforma ortográfica. Daí por que dói, sóis & cia. solitária exibem o grampinho.
Companhia
O ditongo ei entrou na dança do oi. As paroxítonas mandaram o agudão plantar batata em terra infértil. Hoje, ideia, assembleia, teteia etc. e tal se grafam assim — sem lenço nem documento.
Igualzinho
Tal qual o irmãozinho oi, o ei mantém o acento nas oxítonas e nos monossílabos tônicos: papéis, pincéis, tonéis, anéis, painéis.
Fonte: Blog da Dad
Dad Squarisi transita com desenvoltura pelo universo da língua. É editora de Opinião do Correio Braziliense, comentarista da TV Brasília, blogueira, articulista e escritora. Assina as colunas Dicas de Português e Diquinhas de Português, publicadas por jornais de norte a sul do país; Com Todas as Letras, na revista Agitação, e Língua Afiada, na Revista do Ministério Público de Pernambuco. Formada em Letras, com especialização em Linguística e mestrado em Teoria da Literatura, concentra o interesse, sobretudo, na redação profissional – o jeitinho de dizer de cada especialidade, cada grupo, cada mídia. Mas é tudo português. A experiência como professora do Instituto Rio Branco, consultora legislativa do Senado Federal e jornalista do Correio Braziliense iluminou o caminho dos livros Dicas da Dad – Português com humor, Mais dicas da Dad – Português com humor, A arte de escrever bem, Escrever melhor (com Arlete Salvador), Redação para concursos e vestibulares (com Célia Curto), Como escrever na internet, 1001 dicas de português – manual descomplicado, Sete pecados da língua, publicados pela Contexto, além de Superdicas de ortografia, Manual de redação e estilo para mídias convergentes, dos Diários Associados, e de livros infantis – de mitologia e fábulas.