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A gramática na universidade, a gramática na escola. A gramática, afinal, pelo texto.

Os últimos trinta anos viram uma revolução no ensino escolar da gramática. Nesse período, muitas tendências surgiram e desapareceram, mas parece ser consensual o entendimento de que não se pode ensinar gramática “tradicionalmente”.

Com esse adjetivo “tradicional” associado à expressão “ensino de gramática”, geralmente fala-se do ensino de gramática normativa, de uma gramática descontextualizada, sem finalidade prática na vida dos alunos. Ora, qual, então, é a gramática que deve ser ensinada na escola? Que tipo de formação teórica é necessária para que professores em formação inicial e continuada possam ter um bom desempenho na condução pedagógica do ensino da gramática?

A gramática na universidade, a gramática na escola. A gramática, afinal, pelo texto.

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As respostas para essas duas perguntas são críticas para o estabelecimento de diretrizes, para a formação e atualização de professores, bem como para a preparação das lições escolares. Laboratório de ensino de gramática oferece soluções para esses e outros questionamentos que professores, em qualquer nível de formação, possam ter feito em algum momento da sua atuação docente.

Uma das teses que o livro defende é a de que professores da educação básica necessitam de formação teórica consistente para atuação docente. O fato é que, como diz Maria Helena de Moura Neves, em seu livro Que gramática estudar na escola? (Editora Contexto, 2003), “cabe especialmente aos docentes da graduação em Letras, que são os formadores de professores de língua materna, preparar as bases de um tratamento escolar cientificamente embasado – e operacionalizável – de gramática do português para falantes nativos, o que representaria dar aquele passo tão reclamado entre o conhecimento das teorias linguísticas e a sua aplicação na prática” (p. 17).

O Laboratório dá esse passo tão reclamado entre teoria e prática, entre um tratamento escolar cientificamente embasado e operacionalizável. A obra procede a uma exposição de qual teoria pode embasar o ensino escolar da gramática, chegando a uma concepção funcional de gramática, segundo a qual a gramática de uma língua organiza as relações (sintaxe), constrói as significações (semântica) e define os efeitos comunicativos (pragmática).

São duas as principais implicações dessa visão teórica funcional de gramática – funcional porque penetra nas funções que ela desempenha na construção dos textos. A primeira é o entendimento de que a gramática da língua só pode ser analisada e estudada no texto, não em frases soltas e inventadas, desprovidas de força comunicativa. A segunda diz respeito ao fato de que, nessa visão, o trabalho com a gramática não é pautado por categorias (como classes de palavras) ou por papeis sintáticos (como sujeito e objeto), ainda que seja necessário chegar a essa metalinguagem em algum ponto das lições. O ponto de partida são os processos básicos de constituição dos enunciados e dos textos, como a predicação, a referenciação e a junção, que fazem do texto uma peça coesa e funcional das interações humanas.

Fica estabelecido, assim, o direcionamento metodológico desenvolvido no Laboratório: ir a textos dos mais diversos gêneros discursivos e fazer os alunos verificarem a gramática da língua operando na construção dos significados. Nessa direção é que o livro apresenta sugestões de atividades tanto para estudantes universitários quanto para estudantes da educação básica.

Como fica dito na Apresentação do Laboratório, a expectativa dos autores é de que seja possível “avançar na ideia de que refletir sobre as regularidades da língua, assim como sobre as diferenças e as mudanças que se operam nas formas e nos usos linguísticos, representa captar o mecanismo gramatical da língua, que produz os significados e obtém os efeitos, na linguagem”.

O estudo da gramática, seja na universidade, seja na escola, deve fazer os estudantes penetrarem na vida da linguagem. Isso significa que todas as atividades da vida humana de que a língua é uma parte constitutiva são arenas legítimas nas quais se pode verificar a gramática em seu pleno funcionamento. Basta ter a teoria certa para isso.


André V. Lopes Coneglian é professor da Faculdade de Letras (FALE) da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), onde coordena o Núcleo de Pesquisas em Semântica e Pragmática (NuPeSP). É licenciado em Letras (Português e Inglês) pela Universidade Estadual de Maringá (UEM). Possui mestrado em Letras pela Universidade Presbiteriana Mackenzie, com período sanduíche na Universidade da Califórnia, Berkeley, e doutorado em Letras pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. É coordenador do Comitê de Linguística na Graduação, da Associação Brasileira de Linguística (Abralin).

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