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Por que precisamos da Educomunicação? | Marciel Consani

Necessária para mim
Minha história com a Educomunicação começa, oficialmente, em 2003 — portanto, há pouco mais de duas décadas — muito por conta da atuação como formador na Secretaria Municipal de Educação de São Paulo, mais especificamente, na Subprefeitura de São Miguel Paulista, na Zona Leste da cidade.

Na época, eu já havia retomado a carreira acadêmica e, na reta final do Mestrado, me sentia dividido entre minha formação pregressa nas Artes e a demanda intensa e aguda dos professores da escola pública pelo que chamamos, nos dias de hoje, de Educação Digital.

Talvez os mais jovens não se lembrem de uma época na qual a Internet ainda era uma recém-chegada ao Brasil e às escolas. Muitos entusiastas a consideravam uma tendência irreversível, alguns até enxergavam nela uma panaceia capaz de minimizar as desigualdades e promover a cidadania, quase que por mágica. Outros eram resistentes à mudança, consideravam a inovação como um modismo passageiro ou temiam seu potencial de subverter a hierarquia no ambiente escolar: era como se os mestres voltassem a ser aprendizes, mas numa condição mais lenta e menos segura que a dos estudantes.

Hoje é certo que nem as melhores nem as piores expectativas depositadas na informática educativa foram cumpridas. Em troca, surgiram outras perspectivas promissoras acompanhadas de muitas demandas desafiadoras:

– As Redes Sociais são usadas por nós — ou será que são elas que nos usam?
– Podemos produzir conteúdo educacional em quantidade e com qualidade inédita, mas estamos preparados para isso?
– Com tanta tecnologia e mídia ao alcance de um clique, os jovens podem ser considerados protagonistas da própria educação?
– Usando esse poder, eles poderão transformar decisivamente a sociedade para melhor?

Essas são as questões que me seduziram para ingressar numa área de estudos, ainda em construção, a que se denominou Educomunicação. As respostas às perguntas colocadas não parecem ser ainda claras ou definitivas. Não obstante, nos dias de hoje, são elas que orientam meu trabalho de professor, pesquisador e autor.                 

Saiba mais

Necessária para toda a sociedade
Imagine que algum evento cósmico devastador interrompesse nosso sistema de comunicações por algumas horas. E se as horas se tornassem dias ou semanas? E se durassem ainda mais tempo?

Será que, se ficássemos sem energia, computadores ou Internet, conseguiríamos retomar nossa rotina anterior? Será que teríamos uma vida “normal” para a qual pudéssemos voltar? 

Nossa vida em sociedade se encontra de tal forma dependente de recursos digitais que, mesmo quem tente se distanciar de computadores e celulares, não conseguirá escapar muito tempo da sua influência no trabalho ou nas relações mais corriqueiras.

Por outro lado, ainda que possamos destacar aspectos virtuosos ou interessantes considerando parâmetros de conforto e eficiência, é difícil afirmar que nossa qualidade de vida aumentou na mesma proporção que a presença dessas tecnologias em nossas vidas.

Pergunte a si mesmo:
– Você consegue controlar seu tempo gasto diante das telas?
– Pode identificar com facilidade quando uma informação veiculada numa rede social é falsa?
– Sente segurança ao navegar e fazer transações nos ambientes virtuais?   

É fácil deduzir que não aprendemos a usar de forma equilibrada as chamadas novas (ou novíssimas) Tecnologias da Informação e da Comunicação. Ou, talvez estejamos enquadrando o problema a partir de um pressuposto errado: a questão não é sobre tecnologia, mas sobre mídia.

A tecnologia sempre buscará nos fazer produzir mais e mais rápido; basicamente, ela serve para isso. Entretanto, a forma como a incorporamos e naturalizamos nossa dependência tecnológica se caracteriza como um fenômeno de base cultural profundamente direcionado por nossas demandas comunicacionais.

Em algum momento, concordamos em diluir nossa atenção e aceitar de forma mais ou menos dócil a mediação das onipresentes interfaces digitais. Quase sem perceber, no espaço de uma geração, reconstruímos nossas relações sociais e interpessoais em novas bases éticas e estéticas, em grande medida, abrindo mão de atitudes mais críticas e ponderadas.

É tentador recorrer à surrada metáfora fílmica declarando que escolhemos “viver na Matrix”, mas, se realmente habitamos um ambiente midiático, a melhor opção é a de entender como funciona esse ecossistema e nadar em suas águas, ao invés de nos deixarmos submergir e afogar na inércia dos hábitos consumistas.

Assim, se a Educomunicação pode oferecer respostas concretas ao nosso dilema midiático/comunicacional, ela o faz, não pela rejeição ou aceitação tácitas de mídias e tecnologias, mas por sua apropriação crítica e contextualizadora.

Por que precisamos da Educomunicação? | Marciel Consani

Para isso, ela se apoia firmemente em três princípios humanistas e contemporâneos que defendidos pela comunicação e pela educação: (1) a promoção do diálogo aberto e democrático, (2) o protagonismo e centralidade do educando na relação pedagógica e (3) um modelo mais inclusivo e equânime de sociedade a ser efetivado hoje e aprimorado no futuro. 


Marciel Consani é músico de formação. Como educador, atua há mais de vinte anos na educação superior, formação docente, ensino fundamental e educação infantil. Professor do curso de Comunicação Social/Rádio e TV das Faculdades Integradas Rio Branco e pesquisador associado ao Núcleo de Comunicação e Educação da Escola de Comunicações e Artes da USP, é mestre em Educação Musical pelo Instituto de Artes da Unesp e especialista em Tecnologias Interativas Aplicadas à Educação pela PUC/SP. Pela Contexto é autor do livro Como Usar o Rádio na Sala de Aula.

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