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Os britânicos apoiavam Churchill unanimemente antes e durante a Segunda Guerra Mundial | Os mitos da Segunda Guerra Mundial

Os britânicos apoiavam Churchill unanimemente antes e durante a Segunda Guerra Mundial

Vários fatores contribuíram para suscitar e perpetuar o mito citado no título deste capítulo. Por um lado, os movimentos e os governos exilados em Londres durante a guerra, frequentemente divididos e isolados, não puderam deixar de se espantar com a fachada de unanimidade apresentada por seus anfitriões britânicos. Por outro, as Memórias da Segunda Guerra Mundial, do próprio Churchill, ao apagar os desacordos e as divergências dentro e fora de seu governo, alimentaram essa impressão, fortalecida pela passagem do tempo. Por fim, graças ao desfecho vitorioso da guerra, aqueles que criticavam sua condução geralmente evitaram falar no assunto depois.

Antes de mais nada, trata-se de determinar quem estava envolvido e quando. Quando se fala dos “britânicos”, pensa-se imediatamente na opinião pública, mas isso inclui a imprensa, o Parlamento, os partidos, o governo, o gabinete de guerra e os chefes de Estado-Maior – sem esquecer o próprio monarca. Parece bem pouco provável que Churchill tenha contado com o apoio constante e indefectível de todos esses elementos do início ao fim da Segunda Guerra Mundial.

O MALDITO DO ESTABLISHMENT

Entre o final de 1936 e o começo de 1939, Winston Churchill é provavelmente o político menos popular da Grã-Bretanha, sobretudo em seu próprio partido. Desde que deixou o Shadow Cabinet* no início de 1931, após uma divergência radical em relação à Índia, passou a ser um “deputado conservador de oposição”. Porém, discordou de seu partido e de todos os outros em questões relacionadas ao desarmamento, à política de defesa deficiente do governo, ao pacifismo do então primeiro-ministro Stanley Baldwin e, por fim, à política de apaziguamento do sucessor Neville Chamberlain. Tanto na opinião pública quanto no Parlamento, seus apelos ao rearmamento, seu apoio ao rei Eduardo VIII e sua oposição resoluta aos acordos de Munique o isolaram politicamente, de modo que, ao final de 1938, ele conta apenas com uma dúzia de aliados na Câmara dos Comuns, ainda que o apoio da maioria deles, como Anthony Eden e Alfred Duff Cooper, se mostre bastante discreto… O fato de que a política de Neville Chamberlain em relação a Munique também tenha sido aprovada pelo governo, pelos partidos, por quase toda a imprensa e grande parte da opinião pública britânica explica amplamente o ostracismo em que se encontrava o deputado Churchill. Até mesmo em seu distrito eleitoral em Epping, constituiu-se um forte lobby para protestar contra sua oposição aos acordos de Munique.2 Também o apoio público do rei Georges VI em pessoa à política de Chamberlain acentuou ainda mais o sentimento de isolamento de Churchill – sem, todavia, alterar sua oposição incondicional às ilusões do apaziguamento e às incoerências do rearmamento.

Foi a entrada dos alemães em Praga, seguida das primeiras exigências à Polônia, que começou a abrir os olhos de muitos no Parlamento, na imprensa, entre os intelectuais e nos meios empresariais – quando se percebe finalmente que a guerra é inevitável, que a Inglaterra não está preparada para ela e que Churchill vinha repetindo isso sem parar havia seis anos. Quando se vai enfrentar uma ditadura fortemente armada, pode-se ficar sem um velho guerreiro como Churchill? Alguns pensam que não, e seus discursos na Câmara dos Comuns encontram ouvidos mais receptivos, ao mesmo tempo que os grandes jornais começam, um após o outro, a exigir seu retorno ao governo: em abril, o Daily Telegraph, o Evening Advertiser e o Sunday Pictorial; em maio, o News Chronicle e o Time and Tide; em julho, o Yorkshire Post, o Observer, o Sunday Graphic, o Daily Mail, o Evening Standard e até o Manchester Guardian, que exorta o primeiro-ministro Chamberlain a “privilegiar o patriotismo às desavenças pessoais”.

Não se trata realmente de desavenças pessoais – mesmo que haja muitas no establishment conservador. A verdade é que Chamberlain teme que o deputado de Epping domine rapidamente seu governo e considera, sobretudo, assim como seus ministros Simon, Hoare e Halifax, que o retorno de Churchill seria uma declaração de guerra a Berlim. Ora, apesar das nuvens ameaçadoras que se acumulam na Europa, Chamberlain ainda busca a paz a qualquer preço – exceto a perda de seu posto. É por isso que seus emissários multiplicam, durante o verão, os gestos de conciliação com o Führer, enquanto pressiona discretamente os poloneses para que negociem com Berlim. Contudo, a ratificação do Pacto Germano-Soviético, em 23 de agosto de 1939, e a invasão da Polônia, em 1º de setembro, põem um fim brutal às ilusões oficiais: diante da perspectiva de uma sublevação em seu governo e em sua maioria parlamentar, Chamberlain não tem outra saída senão declarar guerra. Para todos, até para os adversários mais implacáveis de Churchill, é inconcebível enfrentar um conflito maior sem a participação do único político que conhece a guerra, não a teme e sabe como conduzi-la. Quando começa a Segunda Guerra Mundial, Winston Churchill é então nomeado ao posto que já ocupara um quarto de século antes: o de primeiro lorde do Almirantado.

Para Churchill, não haverá “guerra de mentira”: seus navios buscam impiedosamente a Kriegsmarine, sofrem perdas sensíveis, mas acabam por obter uma esmagadora vitória contra o encouraçado Graf Spee ao largo do rio da Prata. Seu ativismo, assim como seus discursos suntuosos no Parlamento e na BBC, produzem um excelente efeito sobre o moral dos cidadãos comuns, dos militares, dos deputados e até dos ministros. Suas intervenções constantes nos assuntos de seus colegas, bem como os múltiplos planos de ofensiva que ele propõe ao primeiro-ministro, certamente revigoram um governo pouco belicista, mas assustam um primeiro-ministro que quer evitar “provocar a Alemanha”, esperando confusamente que a guerra termine sem que ele precise travá-la de verdade… Como a maioria de seus ministros está igualmente exasperada com as intervenções bastante desordenadas do primeiro lorde em suas áreas de competências,6 é forçoso reconhecer que Churchill não goza de muita popularidade no governo. Ele é mais popular junto à população, mas, em dezembro de 1939, uma pesquisa indica que 63,78% dos britânicos aprovam a política de apaziguamento de Neville Chamberlain – e que este é preferido como primeiro-ministro por 51,69%, contra apenas 30,27% a favor de Churchill (18% sem opinião).

Continue lendo o primeiro capítulo do livro Os Mitos da Segunda Guerra Mundial, dos organizadores Olivier Wieviorka e  Jean Lopez – clique aqui