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Métodos de pesquisa em Relações Internacionais | Lançamento

Este é um livro sobre métodos de pesquisa em relações internacionais. Tem por objetivo oferecer suporte à aprendizagem e ao ensino em nível de graduação em Relações Internacionais. Trata-se de um manual que oferece todos os conceitos e explicações necessários não só para cursar com sucesso uma disciplina de métodos, mas também para preparar um projeto ou realizar um trabalho de pesquisa. Nesse sentido, um estudante de pós-graduação pode também encontrar aqui informações e dicas úteis para a prossecução do seu trabalho.

Antes de começar a falar de métodos de pesquisa propriamente ditos, deve-se reconhecer, à partida, que podem ser uma temática um pouco árida, o que, na nossa opinião, ajuda a explicar algumas resistências que muitos estudantes têm em relação à disciplina. De fato, tais dificuldades traduzem-se em duas crenças errôneas acerca da utilidade das discussões metodológicas. A primeira remete à ideia de que só vale a pena aprender métodos quando se quer escrever uma monografia de conclusão de curso e presumindo-se, assim, que o saber sobre os métodos não tem qualquer utilidade no âmbito da graduação. O segundo erro advém da convicção de que métodos só são úteis para aqueles que querem seguir a vida acadêmica, não apresentando qualquer outra utilidade para a vida profissional. Ambas as crenças estão bastante distantes da realidade.

Métodos de pesquisa em Relações Internacionais | Lançamento

Comecemos por abordar essas ideias no contexto universitário. De fato, a aprendizagem de métodos de pesquisa não é somente para aqueles que desejam fazer uma iniciação científica e/ou uma monografia de conclusão de curso. Basta lembrar que toda disciplina de nível universitário requer em algum momento a realização de trabalhos, sejam eles curtos ou longos, e que os métodos de pesquisa são uma parte essencial do planejamento e da realização desses trabalhos. Por isso mesmo, eles devem ser considerados uma ferramenta organizacional de aplicação geral. Nós sugerimos os métodos de pesquisa por vários motivos: primeiro, eles oferecem técnicas e guias de ação para explorar de forma organizada e estruturada os temas de interesse dos estudantes. Como é que isso é feito? Basta lembrar que na realização de qualquer trabalho, é preciso olhar para a informação – livros, artigos científicos, documentos oficiais, vídeos, enfim, quaisquer que sejam os materiais que se está utilizando – e selecionar os dados que interessam para responder à pergunta da pesquisa. Trata-se de um processo que pode parecer imenso e esmagador, dadas a multiplicidade de materiais e a dificuldade em selecionar aquilo que é importante, mas é aí que entram os métodos de pesquisa. Depois de aprendê-los, torna-se possível olhar para toda essa informação de forma direcionada, ‘recortar’ os dados relevantes e organizá-los num texto coerente. Segundo, aprender métodos de pesquisa também ajuda a resolver eventuais dilemas éticos que possam surgir ao longo da investigação. Exemplos disso incluem o que fazer com informações interessantes que possam ser transmitidas em confidência ao pesquisador no contexto de entrevistas; como lidar com vieses pessoais no processo de análise; e como anonimizar contribuições para a pesquisa.

Mas para além dessa utilidade acadêmica, o conhecimento referente a métodos de pesquisa também pode incidir de maneira decisiva sobre a vida profissional ou pós-acadêmica. Na realidade, o que se aprende na disciplina constitui uma habilidade muito útil, independentemente do caminho que se siga ou da atuação profissional que se venha a ter. Como mencionado, métodos de pesquisa nada mais são do que formas estruturadas e centradas de olhar para as informações, analisá-las e extrair delas o necessário para explicar qualquer evento, circunstância ou fenômeno de interesse. Aprender sobre métodos é, em suma, aprender sobre como organizar e estruturar o próprio pensamento. Na vida pós-universidade, esse conhecimento pode depois ser traduzido num grande número de situações profissionais: desde uma fala bem estruturada feita no contexto de uma reunião importante; passando pela boa elaboração de um relatório imbuído de uma organização, processamento e condensação de informações em larga escala; e chegando à capacidade de tomar decisões levando em consideração informações e circunstâncias complexas, que apenas podem ser bem-sucedidas quando o decisor é capaz de pensar de maneira metódica sobre o que está fazendo.

Este livro surge nessa esteira. Esperamos, portanto, que constitua um manual útil para aprendizagem das competências que tornam o estudante de Relações Internacionais um analista e intérprete ativo das informações com que lida, e não um mero consumidor acrítico das últimas. O que é apresentado aqui é o produto de vários anos ensinando métodos de pesquisa na graduação e na pós-graduação no Instituto de Relações Internacionais da Universidade de Brasília. Os conteúdos foram selecionados com base na experiência da autora e resultam das perguntas mais frequentes recebidas de alunos, não só no contexto de disciplinas de métodos de pesquisa, como também no de orientação de projetos de investigação. Este é o primeiro livro do gênero dedicado especificamente às relações internacionais e tendo por base as necessidades de formação de estudantes brasileiros, ao contrário dos vários manuais disponíveis no mercado que são traduções do inglês. Essas obras foram escritas na sua maioria por autores estadunidenses e destinadas primariamente a alunos dessa nacionalidade.

Antes de apresentar a estruturação do livro, é útil antecipar algumas distinções terminológicas. Metodologia e métodos de pesquisa são conceitos muitas vezes confundidos e utilizados de forma equivalente. Contudo, “metodologia” será aplicada para se falar da moldura interpretativa geral na qual se desenvolve um trabalho, isto é, o contexto teórico ou conceitual em que o trabalho é feito e vai ser percebido. É o caso da etnografia, do feminismo, do estudo de caso, para mencionar somente alguns exemplos.

Os “métodos de pesquisa”, por contraste, equivalem aos meios e às técnicas utilizados para acessar a informação e analisá-la. Além disso, no que diz respeito aos últimos, é útil distinguir entre os métodos de coleta de informação – como a revisão da bibliografia secundária, a realização de entrevistas ou questionários, entre outros –; e os métodos de análise da informação, isto é, aqueles que permitem tratar os dados e extrair deles significados, estabelecer entre eles relações de causalidade ou explicar o funcionamento de estruturas. São disso exemplo a análise de discurso, o process tracing e a codificação, entre outros discutidos neste manual.

Este livro está estruturado em três capítulos claramente definidos. O primeiro é dedicado à coleta de dados, também designado como métodos para a coleta de informação; o segundo debruça-se sobre a análise dos dados coletados, ou seja, os métodos para a análise da informação. O terceiro oferece dois momentos distintos: um analítico, seguindo o fio condutor dos capítulos precedentes; e um momento mais prático, devotado à estruturação de um projeto de pesquisa e de um trabalho acadêmico. Segue-se um breve apêndice sobre softwares de análise auxiliadores da pesquisa, os chamados CAQDAS (Computer-Assisted Qualitative Data Analysis Software), e o manual encerra-se com uma lista de leituras relevantes para aprofundar os tópicos discutidos ao longo do livro.

Detalhando um pouco mais cada capítulo, como foi dito anteriormente, o primeiro incide sobre técnicas de coleta de dados, assim como sobre as várias circunstâncias e dinâmicas que as podem afetar. Como a informação mais comum utilizada em pesquisa é a bibliografia encontrada on-line ou nas bibliotecas, o livro inicia-se explicando a diferenciação entre literatura primária, secundária e cinzenta. Seguese a pesquisa de campo. Esta consiste na entrada, física ou digital, na área que se pretende investigar. Pode ser, por exemplo, uma empresa, uma universidade, ministério, entre outros que serão discutidos mais à frente. Existe toda uma série de dinâmicas que afetam não só as possibilidades de acesso, como também o modo como a pesquisa, uma vez nessa área, pode-se desenrolar. Por isso mesmo, falamos de temas como a existência de gatekeepers – literalmente ‘guardiões do portão’, que medeiam, de forma positiva ou negativa, esse acesso; a pesquisa em contextos perigosos; assim como o modo como vamos ser percebidos pelos participantes – como alguém ‘de dentro’ ou ‘de fora’ – o que pode impactar a recolha de informação. Seguem-se apresentações e discussões sobre outros métodos comuns de recolha de informação, como a observação participante e não participante; a construção de uma amostra para entrevistas, assim como guias sobre como as conduzir; a constituição de grupos focais presenciais e on-line; a elaboração e a aplicação de questionários, assim como a realização de vinhetas.

Da recolha da informação passamos para a sua análise, e o segundo capítulo apresenta uma ampla gama de técnicas para o tratamento dos dados. São abordados temas como a transcrição e a confidencialidade – que são o primeiro passo na análise –, caso sejam realizadas entrevistas ou grupos focais. Segue-se uma série de métodos para análise de dados, uns mais comuns do que outros, que são utilizados em publicações da área de relações internacionais. Estes são a codificação, a análise de discurso, o process tracing, a análise de conteúdo qualitativa e interpretativa, a análise temática e, por fim, a pesquisa histórica. Depois da explicação de cada um desses métodos, segue-se uma breve descrição de um artigo acadêmico em que o método em causa tenha sido aplicado. Na escolha dos métodos para compor este livro, buscou-se combinar métodos comumente utilizados em relações internacionais – como a análise de discurso – com outros que, apesar de ainda não usados na área, oferecem grande potencial para o estudo de temas internacionais, como a análise temática.

Por fim, o terceiro e último capítulo é apresentado em dois momentos, divididos ao longo de cinco seções: um de cariz mais analítico e um outro mais estrutural. O momento analítico começa com uma discussão metodológica, focando na etnografia, na narrativa, no estudo de caso e no feminismo; seguido por uma seção em que se abordam a ética, a posicionalidade e a reflexividade. Na sequência, e num segundo momento de cunho mais organizacional, discorre-se sobre os elementos que devem constar tanto num projeto de pesquisa como num trabalho acadêmico, discussão essa que é complementada com a apresentação de estratégias para escrever um argumento científico.

Ao compilar e discutir esses temas, esperamos que o manual seja de utilidade não só para o professor, mas também para o aluno de Relações Internacionais. Os capítulos estão pensados para serem lidos em sequência no contexto de disciplinas acadêmicas; mas também podem ser lidos individualmente, em função do interesse do leitor nos temas específicos abordados no livro.


Vânia Carvalho Pinto  é professora do Instituto de Relações Internacionais e pesquisadora do Centro de Estudos Globais da Universidade de Brasília. É pesquisadora do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico Tecnológico – CNPq. Foi pesquisadora visitante na Universidade de Coimbra (Portugal).

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