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Formação da nação brasileira | João Paulo Pimenta

Estará correto quem observar que é mais frequente um brasileiro agir de acordo com um sentimento de pertencimento a uma religião ou declarar sua lealdade a ‘Deus’ ou a ‘Jesus Cristo’, por exemplo, do que ‘à nação’. Convém notar, porém, que religiões e nações não são fenômenos excludentes. Pelo contrário! Há muitos casos em que sentimentos nacionais são estimulados por motivos religiosos, enquanto em outros o culto à nação se transforma em uma espécie de religião secular. No Brasil, um dos países mais religiosos do mundo, a morfologia da devoção sagrada – crença em entidades sobrenaturais, observação de liturgias, obediência a hierarquias – é uma poderosa aliada de ideias e práticas relacionadas à nação. Afinal, a exemplo de uma divindade, a nação também é uma invenção humana, uma ideia abstrata que, para se concretizar, necessita algum tipo de fé.

No final do século XX, muita gente anunciou o declínio das nações como entidades capazes de pautar a ação humana. Os prognósticos mais radicais nessa direção quase nunca se verificaram. A globalização, que conhece seu ápice nos dias de hoje, continua a oferecer novos pretextos para a crença em nações, para a submissão a elas, e para a prática de suas derivações – nacionalidades, identidades nacionais, nacionalismos, patriotismos, xenofobia. No caso do Brasil, a atual força da nação continua a se valer de seus componentes de autoritarismo, exclusão social e violência coletiva generalizada. Mas não só. Há quem acredite genuinamente que nossa nação é um valor indispensável a uma vida comunitária pautada por uma diversidade social democrática e tolerante, sem a qual o indivíduo, por si só, não sobrevive. E há quem acredite que essa é a imagem pela qual nossa nação deve ser apresentada no exterior.

Em sua diversidade, bem como em sua força, estabilidade e capacidade de absorver solavancos e golpes, a nação brasileira se assemelha a muitas outras do mundo atual. Sem dúvida. No entanto, cada uma deve isso à sua própria história. Por isso, cada história dessas nações merece ser contada, inclusive para que se entenda o que é, a partir do passado de cada país, o seu presente, e o que pode ser seu futuro.


João Paulo Pimenta é doutor em História. Professor do Departamento de História da USP desde 2004, foi professor visitante em universidades do México, Espanha, Equador, Chile e Uruguai. Especialista em História do Brasil e da América espanhola dos séculos XVIII e XIX, Teoria da História e História do Tempo. É autor de dezenas de trabalhos acadêmicos e de divulgação histórica e de dez livros editados em seis países. Pela Contexto é coautor da obra Dicionário de datas da história do Brasil e autor de Independência do Brasil e Formação da nação brasileira.

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