Por Paulo Saldiva
Regiões mais adensadas, com moradores de menor nível socioeconômico, são localidades onde onde esses efeitos são observados com maior intensidade
Nesta edição de sua coluna, o professor Paulo Saldiva trata do efeito das chuvas e inundações sobre a saúde das pessoas, graças sobretudo a um estudo que, usando centenas de cidades de todos os continentes, mediu essa relação. “O que se viu é que chuvas leves reduzem o risco de adoecimento, porque você tem uma redução da poluição e o aumento da umidade relativa. Mas, quando você tem chuvas torrenciais, chuvas mais intensas, acontece o inverso. Você tem, além das perdas de vida e lesões causadas pela inundação propriamente em si, pelos deslizamentos, existe um período de até 60 dias onde aumenta a mortalidade por causas gerais e a mortalidade por doenças respiratórias e cardiovasculares”, esclarece ele. “Tem mais um componente: não só a intensidade da chuva, mas a sua frequência. Todos nós sabemos que as chuvas intensas estão aumentando a frequência e isso faz com que, quando tem uma chuva daqui a dois anos, você está se recuperando daquela do ano anterior. E isso significa que não só a intensidade, mas o aumento da frequência das chuvas compromete a saúde das pessoas que são diretamente afetadas por elas”.
Esses efeitos são observados com maior intensidade nas regiões mais adensadas, justamente as mais pobres e com menor nível socioeconômico. “As chuvas estão se deslocando da periferia e chegando cada vez mais dentro das cidades, pela ilha de calor, que cria como se fosse uma bomba aspirante que promove esses choques de nuvens com diferentes temperaturas e a gente agora consegue mostrar que isso não acaba quando parou a chuva. Ele continua por 260 dias e aumenta com a frequência. Bom, esse é mais um tema para refletirmos, porque temos duas coisas a fazer: uma de curto e médio prazo, que é aumentar a resiliência urbana a chuvas. Drenagem, áreas verdes, áreas permeáveis, que também vão combater as ilhas de calor. E, de outra parte, temos que pensar no cenário internacional, onde me parece que as coisas estão complicadas neste ano. Vamos ver o que sai na próxima COP, em Belém, e vamos torcer para que a gente tome jeito. Jeito tem, mas nós temos que começar a agir agora”.
Fonte: Jornal da USP por Paulo Saldiva
O professor Paulo Saldiva é autor do livro Vida urbana e saúde

Somos um país urbano: 84% da população brasileira concentra-se em cidades e ao menos metade vive em municípios com mais de 100 mil habitantes. Mas a vida urbana não traz apenas novas oportunidades. Ela propicia doenças provocadas por falta de saneamento, picadas de mosquitos, poluição, violência, ritmo frenético…
E tudo isso não ocorre mais apenas nas grandes cidades, mas também nas médias e mesmo pequenas, quase sempre negligenciadas pelo poder público e pelos próprios cidadãos. Mas, afinal, o que fazer para ter boa qualidade de vida nas cidades? Assim como o médico deve pensar na saúde dos seus pacientes – e não apenas em tratar determinada doença –, uma cidade saudável é aquela em que seus cidadãos têm boa qualidade de vida. E o médico Paulo Saldiva, pesquisador apaixonado pelo tema, mostra que é possível, sim, melhorar e muito o nosso dia a dia.