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Educação em língua materna, Teoria Gerativa e Psicolinguística

Desde que Noam Chomsky, no final da década de 1960, propôs a Teoria Gerativa e a hipótese da Faculdade da Linguagem houve uma mudança de paradigmas na compreensão sobre as propriedades das línguas naturais, que passaram a ser vistas como o resultado de interações entre fatores biológicos e sociais. De acordo com essa hipótese, as línguas naturais fazem parte de uma dotação genética dos seres humanos, típica da espécie, que nos habilita a adquirir línguas na modalidade oral ou sinalizada, de forma natural, já na mais tenra infância. Considerando a postulação desse paradigma, diversas áreas do saber têm incluído, em seus pressupostos e métodos de pesquisa, as propriedades das línguas naturais como parte da mente/cérebro dos seres humanos.

A Teoria Gerativa tem investigado essa hipótese por meio de modelos abstratos sobre a estrutura gramatical das línguas naturais, a Psicolinguística tem investigado as diversas áreas relacionadas ao processamento da linguagem e estudos neurocientíficos têm atestado locais no cérebro destinados ao funcionamento das línguas naturais e aos impactos dos processos de leitura e escrita na configuração cerebral. Apesar de todos esses avanços no campo científico, a maior parte dessas descobertas não tem chegado à educação básica e os métodos de ensino permanecem desconsiderando a faceta biológica das línguas naturais.

No Brasil, desde a década de 1970, diversos autores têm refletido sobre as contribuições da Teoria Gerativa para a educação básica. Perini (1986) analisava criticamente a forma como as gramáticas tradicionais abordavam os conteúdos e afirmava que não seria possível se chegar a uma prática gramatical educacionalmente relevante sem uma fundamentação teórica consistente. Para o autor, “uma formação gramatical intelectualmente sadia só pode ser atingida através de um exame racional e rigoroso do fenômeno da linguagem e da estrutura da língua, nunca através de princípios desconexos” (Perini, 1986: 19).

Lobato (2003), por exemplo, defendia a importância de se levar o conceito de Faculdade da Linguagem para a sala de aula e de se considerar o conhecimento gramatical tácito dos estudantes como ponto de partida para a realização de atividades de reflexão linguística e para o estabelecimento de relações entre a língua falada e a língua escrita. Franchi (2006), partindo também dos referenciais teóricos da linguística gerativista, argumentou a favor da existência de três níveis de análise linguística na escola: nível linguístico, epilinguístico e metalinguístico.

Numa interface entre a Teoria Gerativa e a Psicolinguística, Maia (2019), em Psicolinguística e Metacognição na Escola, relata a experiência pioneira no país de um grupo de pesquisadores que, por meio do uso de eyetracking, avaliaram padrões de leitura de estudantes de uma escola de educação básica antes e após oficinas linguísticas, voltadas para o desenvolvimento da consciência linguística e da leitura crítica de textos.

Em 2020, Chomsky em parceria com Gallego publica um artigo argumentando a favor das contribuições que os conceitos linguísticos vinculados à Faculdade da Linguagem poderiam dar à educação básica. Esses contributos seriam pertinentes “não apenas pelo valor potencialmente intrínseco do conhecimento linguístico, mas também pelo impacto dessa abordagem em habilidades mais gerais, como observar, descrever e comparar dados, formular generalizações ou oferecer argumentos empíricos.” (Chomsky; Gallego, 2020: 1)

Em síntese, a cada dia avoluma-se a literatura que aponta benefícios da adoção de premissas da linguística moderna às práticas educacionais. No entanto, além das reflexões e proposições teóricas é fundamental que haja pesquisas experimentais capazes de avaliar as implicações práticas das diferentes propostas e métodos. Tendo em vista essa necessidade e, com o objetivo de criar instrumentos para auxiliar pesquisadores, professores e estudantes a compreender o processo de ensino-aprendizagem de maneira mais aprofundada, em meados de 2020, as autoras deste artigo deram início ao desenvolvimento de um protocolo de monitorização e avaliação da aprendizagem linguística, cujos primeiros resultados serão apresentados nas seções a seguir.

Um dos princípios da proposta consistiu em articular metodologias de pesquisa em Psicolinguística e em Educação, como forma a tornar os resultados do processo de aprendizagem mais visíveis tanto para o professor como para o aluno e permitir a monitorização e a avaliação da aprendizagem em diversos domínios.

O termo “visível” é usado, portanto, no sentido alargado da abordagem de Hattie (2017: 1) que considera que a aprendizagem dos alunos deve ser “visível” aos professores para que estes identifiquem claramente os atributos que fazem diferença na aprendizagem dos alunos de modo que, ao final, todos os envolvidos no processo, incluindo os próprios alunos, reconheçam o impacto desses atributos na aprendizagem.

O nosso sentido de visibilidade, em alguma medida, também pode remeter ao conhecimento individual geral sobre o quanto sabemos, por exemplo, sobre um tema ou assunto, ou self-knowledge, um dos tipos de conhecimento metacognitivo na classificação de Flavell (1979) e que poderia incluir o conhecimento e o julgamento precisos sobre os nossos pontos fracos e fortes com respeito a tal tema ou assunto (Pintrich, 2002: 221).

Neste capítulo apresentamos o design experimental formulado pelas autoras, Protocolo Experimental para a Visibilidade da Aprendizagem (Previa) em articulação com uma discussão sobre métodos de ensino de gramática. Relataremos, portanto, um estudo em que esse protocolo foi usado e discutiremos também a influência do método de instrução gramatical na aprendizagem de um fenómeno específico da gramática do português – o uso do sinal grave (cf. Pilati; Lourenço-Gomes; Castro, 2020).

O capítulo está dividido em quatro seções. A seção 1.1 traz uma caracterização das abordagens de ensino que serão comparadas nos estudos exploratórios em questão: a tradicional e a da aprendizagem linguística ativa. A seção 1.2 apresenta os princípios do Protocolo Experimental para a Visibilidade da Aprendizagem (Previa). A seção 1.3 apresenta o estudo exploratório desenvolvido. Por fim, a seção 1.4 traz as considerações finais.

Leia um trecho do livro clicando aqui, e para saber mais sobre a obra, acesse nosso site (aqui)


Organizador: Marcus Maia é doutor em Linguística pela University of Southern California  USC, (1994). Realizou estágio de pós-doutorado na área de Processamento da Linguagem como pesquisador visitante na City University of New York  Cuny (2003-2004). Atualmente é professor titular de Linguística do Departamento de Linguística e do Programa de Pós-graduação em Linguística da Faculdade de Letras da UFRJ. É bolsista de Produtividade em Pesquisa, nível 1B (CNPq). 

Autores: Aline Alves FonsecaAna Carolina de CastroAndressa Christine Oliveira da SilvaAniela Improta FrançaBárbara Furtado FariasCristina FloresDaniela Cid de GarciaDébora da Silva GalvãoEduardo KenedyEloisa PilatiErica Dos Santos RodriguesIngrid FingerJanaina WeissheimerJessica BarcellosJoana SouzaJosé MoraisJuliana Novo GomesKátia AbreuLeonor Scliar-CabralLilian Cristine HübnerLorrane MedeirosMárcio Martins LeitãoMarcus MaiaMaria do Carmo Lourenço-GomesMaria Teresa Carthery-GoulartMercedes MarcileseMichele Calil dos Santos AlvesNatália Bezerra MotaRaquel Meister Ko. FreitagRégine KolinskyRodrigo Lopes de JesusRosângela GabrielThais Gomes dos SantosVictor Pereira de Lima.


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