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Cooperação internacional | Lançamento

A cooperação entre Estados ou entre outros tipos de agrupamentos situados em localidades distintas é tão antiga quanto a própria história da humanidade. Trata-se de um fenômeno que abarca uma multiplicidade de modalidades, tanto em termos de número e tipos de partes envolvidas quanto em termos temáticos. Porém, ao analisar determinada iniciativa de cooperação internacional é necessário não apenas identificar as partes, as modalidades e os temas que envolve; também é preciso compreender sua trajetória, incluindo os fatores que levaram à sua emergência e questões relacionadas à sua implementação e à distribuição de ganhos entre as partes.

Por um lado, a cooperação internacional é, como o próprio termo indica, uma modalidade de cooperação, cuja definição ampla remete à necessidade de mobilizar esforços de duas ou mais partes para que determinado(s) objetivo(s) seja(m) atingido(s). Não é necessário que todas as partes envolvidas possuam um mesmo objetivo ao cooperar, podendo sustentar objetivos distintos. Esses objetivos podem envolver ganhos materiais, relacionados a aspectos econômicos ou securitários, ou ganhos de natureza sociológica, como aqueles associados à busca por reconhecimento de uma ou mais partes como iguais.

Já definições mais restritas de cooperação, as quais se debruçam sobre iniciativas que se sustentam ao longo do tempo, levam em conta o caráter voluntário e negociado de determinada interação, os esforços envidados pelas partes para sua consecução e a satisfação dos envolvidos com os ganhos obtidos. É possível, inclusive, encontrar perspectivas que não tomam determinado fenômeno como cooperativo apenas por envolver ação conjunta, sendo a distribuição igualitária de recompensas entre as partes um dos critérios para enquadrar determinada interação como cooperativa ou não.

Por outro lado, a cooperação internacional pode envolver particularidades em relação à cooperação entre indivíduos ou organizações situados dentro de um mesmo país. Uma das razões fundamentais para isso é o fato de as relações no âmbito internacional acontecerem em um contexto marcado pela ausência de um governo central, o que pode se configurar como desincentivo a comportamentos cooperativos. Isso porque, nas relações internacionais, não há instâncias universais imbuídas de autoridade para garantir que os acordos sejam implementados. Esse ambiente anárquico, contudo, não leva necessariamente ao conflito, tendo em vista que relações marcadas pela interdependência podem tornar a cooperação o caminho mais racional para que os Estados realizem seus objetivos.

É bastante comum a visão de que cooperação e conflito são dinâmicas antagônicas, e de que a cooperação é algo bom e o conflito, algo ruim. No entanto, ausência de cooperação pode simplesmente denotar ausência de interações, e não presença de conflito, ao passo que a presença do último pode ser relevante para a evolução das relações sociais, como reconheceram os economistas clássicos e o próprio Marx.

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Contudo, em um contexto marcado pela revelação dos impactos sociais e ambientais do modo de produção capitalista e, particularmente, pelas grandes guerras mundiais, a dicotomia entre cooperação e conflito se fortaleceu nos estudos sobre o tema. Ela foi consagrada pela teoria dominante sobre a cooperação, a qual também influenciou os estudos de cooperação internacional: a teoria dos jogos. Mesmo para essa teoria, no entanto, a cooperação não é um bem absoluto, tendo em vista que se reconhece a irracionalidade de seguir cooperando com uma contraparte que não coopera e, que a cooperação entre determinadas unidades pode ocorrer em detrimento dos interesses das unidades excluídas dessa interação.

Tomando as discussões anteriores como ponto de partida, este manual pretende introduzir o leitor às principais dinâmicas e aos debates relacionados à cooperação internacional em âmbito estatal e não estatal. Para abordar o âmbito estatal, serão consideradas as trajetórias da cooperação em três vertentes: Norte Norte, Sul-Sul e Norte-Sul. No âmbito não estatal, serão mencionados os papéis das organizações da sociedade civil, dos governos subnacionais e das universidades. Por fim, para melhor ilustrar a interação entre dinâmicas estatais e não estatais, serão apresentados breves ensaios sobre quatro casos: o da cooperação nuclear, o da cooperação alimentar, o da cooperação ambiental e o da cooperação em saúde.

É importante mencionar que este livro, embora dialogue com conceitos ou elaborações relacionados a Organizações Internacionais, História das Relações Internacionais, Teoria das Relações Internacionais, Análise de Política Externa e Economia Política Internacional, não se debruça extensivamente sobre esses campos, já cobertos por volumes anteriores da Coleção RI (Relações Internacionais) da Editora Contexto.

Nesse sentido, a ideia não é esgotar as discussões de campos correlatos, mas abordar determinados temas com os quais dialogam a título de esclarecimento ou ilustração. Em especial, alerta-se para o fato de as seções de desenrolarem, em grande medida, em formato cronológico, o que não significa que se pretenda cobrir todos os eventos e atores relevantes. Por fim, é importante mencionar que este manual confere atenção diferenciada à inserção dos países em desenvolvimento nas relações cooperativas internacionais, com ênfase no caso do Brasil, local onde a autora vive e a partir do qual acumulou experiência acadêmica e prática no campo da cooperação.


Iara Leite é professora é professora do Departamento de Economia e Relações Internacionais da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), onde lidera o grupo de pesquisa (CNPq) Relações Internacionais e Ciência, Tecnologia e Inovação. Doutora em Ciência Política pelo Instituto de Estudos Sociais e Políticos da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (IESP-UERJ), foi pesquisadora visitante no Georgia Institute of Technology (Estados Unidos) e realizou estudos pós-doutorais na Universidade de Brasília. Atualmente é pesquisadora visitante no Latin American Centre da Universidade de Oxford (Reino Unido).

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