Por Maria Isabel da Silva Leme
A sociabilidade, objeto deste livro, foi escolhida em função da sua importância para a nossa sobrevivência, favorecendo a cooperação, a convivência harmoniosa, o bem-estar, e assim, estando presente em quase todos os momentos de nossas vidas. Ela pode ser definida como a capacidade de nos relacionarmos de modo adequado com outras pessoas, por meio de conhecimentos que já temos, e ainda, através de processos como a empatia, ou seja, a capacidade de nos colocarmos no lugar do outro, entendendo seus sentimentos e desejos.
Neste sentido, uma situação que pode prejudicar a sociabilidade é o conflito interpessoal, porque envolve oposição entre duas ou mais pessoas, e pode ser tanto bem, como mal resolvido. Isto porque existem diferentes formas de reação, como por exemplo, a vítima tentar resolver a situação apelando para a violência, ou negociando uma solução, ou até não reagindo, o que depende do tipo de agressão, da experiência com a situação, e outras características como personalidade. Um tipo de conflito interpessoal tratado mais extensamente no livro, e que vem ganhando cada vez mais atenção, em virtude das consequências negativas para a vítima, é causado por um tipo de assédio, mais conhecido como bullying. Este prejudica não só as relações da vítima com o agressor, mas pode também impactar sua saúde mental, e ainda, a convivência no ambiente onde estão inseridos.

O bullying se caracteriza pela perpetração de agressões verbais e até físicas contra uma ou mais vítimas. No caso das verbais — as mais frequentes —, podem ocorrer tanto presencialmente (mais comum entre jovens), quanto remotamente, como é o caso do cyberbullying nas redes sociais, que continua a crescer, segundo o verificado em pesquisas relatadas no livro. Deste modo, é importante que seja dada atenção a esse tipo de situação, em razão das consequências negativas para a vítima, como intenso sofrimento emocional, sentimento de humilhação, inadequação, vulnerabilidade, dentre outras. Além disso, pode também trazer consequências negativas para as testemunhas do assédio, criando um clima negativo e de insegurança no ambiente onde ocorre.
Por essas razões, o conteúdo abordado no livro é importante tanto para educadores já em atuação, como para aqueles ainda em formação, para que possam intervir com segurança nas situações que presenciam, ou apenas tomam conhecimento. A atenção à convivência entre os alunos é importante não só para aprendizagem escolar, mas principalmente, para uma intervenção adequada porque nem sempre as vítimas relatam o assédio aos docentes. Além disso, a intervenção não pode se limitar à interrupção do conflito, sem verificação do que ocorreu e do motivo. É necessário atentar para a frequência dessas ocorrências, assim como a natureza delas e as reações dos envolvidos, para que se possa intervir adequadamente e favorecer o desenvolvimento emocional dos alunos. As intervenções em forma de programas voltados para a melhoria da convivência na escola, tanto entre alunos como com professores, podem produzir resultados positivos sobre a incidência de conflitos e bullying.
O livro trata também da importância da família na sociabilidade, pela sua influência sobre as formas que os filhos adotam para lidar com situações conflituosas; formas essas relacionadas às práticas de criação adotadas pelos pais, dos conflitos que delas decorrem. Todavia, vale ressaltar que, embora as práticas interfiram de modo importante, não são determinante no modo como os filhos lidam com as situações conflituosas. Os educadores escolares podem orientar os pais sobre como intervir nos conflitos que presenciam ou lhes são relatados pelos filhos, e com isso favorecer a sociabilidade estudantil. A conclusão é que o papel da escola na constituição da sociabilidade se faz muito importante ao favorecer a convivência diversificada com os pares de idades e de origens diversas. Contudo, devido a essa característica, a escola também se apresenta como ambiente mais conflitivo, favorecendo ocorrências como o bullying, e evidenciando a necessidade de intervenções para corrigi-las.
Também é analisada a sociabilidade no trabalho, focando os ambientes onde são mais frequentes, os tipos de ocorrências mais recorrentes, os principais perpetradores e vítimas de assédio, assim como o papel dos gestores na intervenção. São analisadas, ainda, as variáveis que favorecem o assédio, como a organização do ambiente e sua prevenção, e a discussão sobre regras claras de conduta. E por último, é tratada a influência da mídia sobre a sociabilidade, que tem sido potencializada pelo surgimento da Internet, especialmente as redes sociais, cujo impacto tem sido significativo, principalmente entre os jovens. A relação da sociabilidade com as mídias sociais é complexa, pela interferência de muitas variáveis como características demográficas, culturais e pessoais sobre o poder da tecnologia, não se podendo estabelecer relações determinantes entre elas.
Finalizando, as principais conclusões a respeito das diversas fontes de influência já identificadas sobre a sociabilidade estão no último capítulo do livro. Nele, além dessas informações, estão também algumas recomendações aos educadores encontradas nas pesquisas sobre como estimular positivamente a sociabilidade dos jovens, propiciando-lhes uma melhor qualidade de vida em suas relações com as pessoas com quem convivem.
Maria Isabel da Silva Leme é psicóloga e docente do Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo. Além de lecionar, pesquisa aspectos relevantes do processo de aprendizagem, como a sua transferência, por meio da solução de problemas, os conflitos interpessoais, suas influências e suas formas de manifestação, como o bullying que afeta a sociabilidade.