A comunicação não pode ficar em silêncio. Isso desrespeita e contraria a sua natureza. Palavra silenciada é palavra morta. Aliás, quando o diálogo não acontece, não há conexão de sentimentos e a essência do ser humano agoniza. Lamentavelmente, esse quadro desfila diante de nós, e não há nele qualquer constrangimento ou cuidado no sentido de não chocar as pessoas um pouco mais atentas. Mas o que é preciso para que o diálogo aconteça?
Moacir Gadotti, diretor do Instituto Paulo Freire em São Paulo, sintetizou muito bem uma resposta para essa pergunta: “O diálogo se dá entre iguais e diferentes, nunca entre antagônicos.” Ao mesmo tempo, isso nos leva a pensar, também, que ele nunca é fruto de dois monólogos. E um detalhe que pode significar muito: ao contrário do que parece, no diálogo a pausa é tão significativa quanto a fala, porque é nesse momento que se dá a comunhão entre os interlocutores.
No entanto, de nossa parte, e sem nos dar conta, já nos acostumamos ao apartheid que diariamente se instala em casa, diante dos nossos olhos passivos. Pior: incorremos no absurdo de festejar a situação em que nos metemos. Sentimos-nos conectados, sim, mas essa ligação é efêmera, porque não ultrapassa os limites da tela do celular ou do computador. É como se estivéssemos agindo sob o efeito de uma cegueira crônica, fruto do silêncio consentido que há em nossa pouca disposição para falar e ouvir sem julgamento prévio. Vivemos apressados e polarizados. A começar pelo ambiente familiar. Assim, como esperar que isso não contamine outros espaços onde colocamos os pés?
Nesse sentido, uma mudança de paradigma se impõe. Pesquisando para escrever, ouvi a opinião certeira da educadora Maria Montessori, afirmando que “As pessoas educam para a competição e esse é o princípio de qualquer guerra. Quando educarmos para cooperarmos e sermos solidários uns com os outros, nesse dia estaremos a educar para a paz.”
Gostando ou não, pessoas mudas, apenas competitivas, e confiantes de que o melhor caminho para viver em paz é ser surdo, cego e mudo, ou tagarelas que vivem uma nova edição da Torre de Babel, ficam impedidas de reformar a sociedade em que vivem. Ora, para não ser mudo, o primeiro passo é abandonar a condição de cego e falar com adequação, porque certos debates geram mais calor do que luz. Felizmente, mudar de posição é algo que não pede força, apenas exige que se disponha de vontade, atitude – se existe isso, existe um caminho.
Decididamente, portanto, esse quadro precisa ser redesenhado. E isso não pode ficar para depois. O problema exige resposta urgente. Não se trata de um projeto desses que guardamos para o futuro. Sem entrar num mundo de fantasia, que não é o caso, convém lembrar que a ausência de diálogo entre as pessoas, sobretudo em casa, o primeiro grupo social, não pode continuar impondo a sua vontade soberana por mais tempo. Ela já foi longe demais.
Como se pode ver, é indispensável incluir a prática de falar e ouvir, de maneira solidária e fraterna, em nossa rotina. Só assim, os laços familiares se fortalecerão, ganhando resistência suficiente para o enfrentamento de tantas lutas que surgem em nosso horizonte, pessoal e social, apenas para citar dois exemplos.
Os instrumentos para essa transformação, pessoal e social, incluem a vontade de sair da zona de conforto, além de toda a criatividade que possa ser empregada nesse grande projeto. E um aspecto essencial da criatividade, inclusive no diálogo, é confiar que em tudo se vive uma troca, não um julgamento ou um cabo de guerra para medir força. É da palavra dita com liberdade e da livre associação de ideias que nascem os projetos revolucionários. E não conheço nada que seja mais eficiente, para um brainstorming ou “tempestade de ideias”, do que um diálogo, ocasião em que todo julgamento é suspenso para que o novo seja encontrado.
De caso pensado, os atores, para usar uma linguagem da moda, são todos os que entendem a importância de ser protagonista de fato e contribuir com efetividade. Para isso, as pessoas deverão estar motivadas para empregar o seu melhor, a fim de que a comunicação estabeleça vínculos reais e verdadeiros entre os envolvidos e produza efeitos que ressuscitem o significado da expressão “qualidade de vida”.
Os benefícios serão incontáveis. Eis por que acordar a palavra a ser falada com critério e ouvida com receptividade é um trabalho de todos: pais e filhos, em primeiro lugar, fortalecendo-se na escola e, depois, irradiando-se para o mundo.
RUBENS MARCHIONI é palestrante, publicitário, jornalista e escritor. Eleito Professor do Ano no curso de pós-graduação em Propaganda da Faap. Autor de Criatividade e redação, A conquista e Escrita criativa. Da ideia ao texto. [email protected] — https://rumarchioni.wixsite.com/segundaopcao