A crise assusta. Não fomos preparados para ela. Quando chega, por vezes nos paralisa. Embora não se justifique, nossos olhos a transformam, dando-lhe traços monstruosos. Diante dela, somos a criança que, olhando para uma pequena sombra, enxerga um fantasma fazendo o aquecimento para devorá-la viva, depois de tê-la asfixiado.
Uma das nossas formas de reação frente à crise consiste em atribuir o seu surgimento a alguém ou algum fator externo, podendo mesmo incluir forças superiores, divinas. Se não entendemos o sentido natural, debitamos o fato à esfera sobrenatural, onde habitam as respostas que ainda não encontramos.
Outra maneira de reagir, mais produtiva, consiste em entender a origem da palavra, seu significado e descobrir o que ela nos oferece. Em seu livro Criatividade no trabalho e na vida, Roberto Menna Barreto lembra: “A propósito, ‘crise’ é palavra representada, em chinês, pela junção de dois ideogramas: o primeiro significa ‘obstáculo’; e o segundo, ‘oportunidade’. Somente com bom humor você será capaz de reconhecer o segundo” – conclui. Bom humor e atitude, acrescentem-se.
Nesse sentido, e para perceber aí um espaço de realização, é fundamental enxergá-la de um jeito novo, a fim de que seja transformada em uma força que joga a nosso favor. E isso, é claro, supõe dispor de conhecimentos necessários, habilidades para transformar esse cenário em ações concretas, além de atitude para enfrentar o desafio.
Lutar contra a crise é um trabalho que envolve a busca por informações sobre o tema, a elaboração de um projeto de ação, o cálculo do empenho necessário, o estabelecimento do que será feito, as providências práticas e a avaliação permanente do trabalho.
Vale lembrar que crise é algo que não pode seguir o um trajeto livremente. Assim, é importante saber com exatidão por que ela deve ser eliminada, os recursos envolvidos nesse projeto, a maneira como tudo será feito do ponto de vista prático e o objetivo a ser atingido por essa operação.
Uma crise oferece oportunidades que têm determinadas características, e elas apenas servem para defini-la. Mas, olhada de um novo ponto de vista, pode-se perceber benefícios que estejam de acordo com nossos valores. Tudo é questão de experimentar. Nesse sentido, vale a pena conhecer a maneira como a escritora francesa Françoise Sagan lidou com uma crise em sua vida literária. Perguntada se abandonava o trabalho em andamento e, depois, o tomava de novo, Sagan respondeu: “Não, eu desejava ardentemente terminá-lo: jamais desejei tanto qualquer outra coisa. Enquanto eu o estava escrevendo, pensei que talvez houvesse oportunidade de ele ser publicado. Finalmente, quando estava terminado, pensei que a coisa era irrealizável. Eu estava surpresa com o livro e comigo mesma.” Desejar, acima de tudo, terminar um trabalho, querer que ele seja publicado e se surpreender diante da conquista trazida por todo esse empenho, isso sempre dá um ótimo resultado.
Para viver a mesma experiência de Sagan e mais uma infinidade de escritores, somos convidados a rever nossas posições em relação às crises da vida em geral e da produção literária.
Rubens Marchioni é palestrante, produtor de conteúdo, blogueiro e escritor. Eleito Professor do Ano no curso de pós-graduação em Propaganda da Faap. Pela Contexto é autor de Escrita criativa: da ideia ao texto. https://rumarchioni.wixsite.com/segundaopcao / e-mail: [email protected]