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Línguas indígenas e Gramática Universal | Bruna Franchetto, Márcia Damaso Vieira, Marcus Maia, Miriam Lemle

Muitas vezes, quando utilizamos a expressão ‘gramática universal’, a palavra ‘universal’ não deve ser interpretada literalmente. Existem alguns universais linguísticos que são, na verdade, tendências estatísticas encontradas através de estudos comparativos de centenas de línguas. Há, porém, alguns elementos e operações que são, de fato, universais no sentido estrito de se fazerem presentes em todas as línguas humanas: por exemplo, a estrutura de qualquer sistema de comunicação utilizado dentro de uma comunidade de fala se baseia nos mesmos tipos de elementos (por exemplo, nomes, verbos, sílabas acentuadas ou tonais, distinções temporais, expressão de negação, imperativas, e interrogativas). Além disso, em todas as línguas, essas estruturas estão envolvidas nos mesmos tipos de operações. A partir de um pequeno número de regras de combinação, as línguas derivam estruturas maiores de estruturas menores, produzindo assim, uma ampla variedade de significados e de sequências de sons. Isso funciona, justamente, porque as regras de combinação linguística têm certas propriedades. Elas devem ser recursivas (o que significa que o resultado de uma dessas operações pode servir como entrada para o mesmo tipo de operação) e devem ter um núcleo (o que significa que quando dois elementos se combinam, eles estão em uma relação assimétrica: apenas um deles determina as propriedades gerais da combinação; ou seja o ‘todo’ formado é necessariamente ‘do mesmo tipo’ (i.e. nominal, verbal) de exatamente uma das partes que o compõem).

A Gramática Gerativa é o estudo das estruturas e operações que produzem a diversidade fonológica, morfológica e sintática que as línguas humanas apresentam. Historicamente, esta linha de pesquisa concentrou-se mais em línguas bem conhecidas, de origem europeia. Entretanto, é igualmente – ou ainda mais – importante confrontar as teorias da Gramática Gerativa com línguas menos conhecidas, pois elas podem fornecer informações preciosas acerca do que é mais amplamente (im)possível, guiando-nos a modificar essas teorias, e com isso, modificar também a nossa compreensão do que é uma língua humana possível.

Este livro é importante por diversos motivos: cientificamente, coloca as línguas indígenas do Brasil e a Teoria da Gramática Universal frente a frente, em diálogo. Desta forma, o livro se organiza em termos de fenômenos linguísticos teoricamente relevantes. Além disso, demonstra o valor dessas línguas para a Ciência Cognitiva, o que é ainda mais relevante, uma vez que o Brasil, apesar de ser uma nação multilíngue em termos demográficos, nem sempre adotou decisões de política pública que reconheçam e incentivem o multilinguismo. Esperamos que o cuidadoso trabalho dos autores de descrever os detalhes das gramáticas das línguas aqui retratadas possa colocá-las no mapa para os estudantes de Linguística no Brasil, que estarão envolvidos na formulação de futuras políticas públicas, consultorias educacionais e teorias linguísticas.